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13 de setembro de 2014

83 – Motorista e dona de carro devem indenizar ciclista atropelado em sua mão de direção

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A 2ª Câmara de Direito Público do TJ confirmou sentença da comarca de Criciúma e determinou que o motorista e a proprietária de um carro paguem R$ 70,6 mil, por danos morais e materiais, a um ciclista atropelado em via pública e em sua mão de direção.

Os demandados terão, ainda, de arcar com pensão mensal vitalícia em favor do autor, desde a data do acidente. O acidente aconteceu em 28 de julho de 2008, por volta das 6 horas, quando o ciclista se dirigia ao serviço pela avenida Universitária, em Criciúma.

Ele ficou em coma e sofreu traumatismo craniano, que resultou em paralisia de todo o lado direito do corpo e motivou a realização de duas cirurgias de crânio. Em apelação, o motorista alegou não haver prova de sua responsabilidade no acidente, mas sim culpa exclusiva da vítima, que teria invadido a pista de rolamento. A proprietária do carro, por sua vez, defendeu sua ilegitimidade no processo por ter vendido o veículo em data anterior ao acidente ¿ fato que não comprovou. O relator, desembargador Monteiro Rocha, não acolheu os pedidos. Ele observou a afirmação do condutor de que, após o acidente, não parou pela inexistência de acostamento onde encostar o veículo.

Neste ponto, o magistrado ponderou que, se o réu não conseguiu estacionar uma camionete no acostamento, o ciclista também não conseguiria trafegar com sua bicicleta pelo mesmo local, de modo que a legislação lhe garante, nesse caso, o direito de transitar pela pista de rolamento no mesmo sentido de circulação. As condições de visibilidade e climática, não ideais – período noturno, chuvoso e sem iluminação -, também foram destacadas no julgamento.

“O dever de cautela exigia que o veículo fosse conduzido em velocidade moderada e com maior diligência, pois era perfeitamente previsível que veículo de menor porte (bicicleta, por exemplo), ou até mesmo pedestre, por descuido ou necessidade, viesse a ingressar, ainda que parcialmente, no leito da pista, tendo em vista que a rodovia não contava com acostamento”, finalizou Monteiro Rocha (Apelação Cível n. 2013.088464-0).

Responsável: Ângelo Medeiros – Reg. Prof.: SC00445(JP)
Textos: Américo Wisbeck, Ângelo Medeiros, Daniela Pacheco Costa, Maria Fernanda Martins e Sandra de Araujo
Fonte.
Art.-201-CTB-um-metro-e-meio
Inteiro teor do Acórdão.
document
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Apelação Cível n. 2013.088464-0, de Criciúma

Relator: Des. Monteiro Rocha

DIREITO CIVIL -OBRIGAÇÕES -RESPONSABILIDADE CIVIL -ACIDENTE DE TRÂNSITO -ATROPELAMENTO DE CICLISTA POR AUTOMÓVEL -PENSÃO MENSAL, DANOS MATERIAIS E MORAIS -PROCEDÊNCIA PARCIAL INCONFORMISMO RECURSOS DOS RÉUS -ANÁLISE CONJUNTA -1. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA RÉ PROPRIETÁRIA DO VEÍCULO -ALIENAÇÃO ANTERIOR AO ACIDENTE -FATO NÃO PROVADO -RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE O PROPRIETÁRIO E O CONDUTOR PRELIMINAR AFASTADA -2. NULIDADE DA SENTENÇA -2.1 JULGAMENTO ULTRA PETITA -DANO MORAL ARBITRADO M VALOR SUPERIOR AO DO PEDIDO INICIAL -VALOR MERAMENTE SUGESTIVO -AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO PENSÃO MENSAL INCLUINDO GRATIFICAÇÃO NATALINA E 1/3 DE FÉRIAS -PEDIDOS IMPLÍCITOS -POSSIBILIDADE -2.2 JULGAMENTO EXTRA PETITA -CONDENAÇÃO EM DANOS ESTÉTICOS -AUSÊNCIA DE PEDIDO -INACOLHIMENTO INTERPRETAÇÃO LÓGICO-SISTEMÁTICA DOS PEDIDOS INDENIZATÓRIOS -NULIDADE AFASTADA -3. AFASTAMENTO DO DEVER DE INDENIZAR

ATROPELAMENTO DE CICLISTA EM SUA MÃO DE DIREÇÃO CONDIÇÕES CLIMÁTICAS DESFAVORÁVEIS -DEVER DE CAUTELA DESATENDIDO -IMPRUDÊNCIA CARACTERIZADA INDENIZATÓRIA MANTIDA -4. REDUÇÃO DO QUANTUM DANOS MORAIS -LESÕES PERMANENTES PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS -INACAPACIDADE LABORATIVA -VALOR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL AO DANO -QUANTUM MANTIDO -5. AFASTAMENTO DA PENSÃO MENSAL -PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO REVIDENCIÁRIO -VERBAS DISTINTAS -POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO -LESÕES PERMANENTES -ALIMENTOS VITALÍCIOS -6. AFASTAMENTO DA CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL -INACOLHIMENTO -PRESERVAÇÃO DO DIREITO DO OFENDIDO -APLICAÇÃO DO ART. 475-Q DO CPC RECURSOS DESPROVIDOS -SENTENÇA MANTIDA.

 

1. Indemonstrada cabalmente a alienação do veículo antes do acidente, é parte legítima passiva ad causam, respondendo solidariamente por indenização decorrente de acidente de trânsito, proprietário e condutor do veículo envolvido em sinistro.

2. Inocorre julgamento ultra petita no deferimento de indenização por danos morais em montante acima do requerimento inicial porque o pedido é estimativo. Não é nula sentença que inclui no pedido de pensão mensal, valor referente ao décimo terceiro salário, terço de férias e danos estéticos, pois tais verbas decorrem de indenização integral ao ofendido.

3. Age com imprudência motorista que, desatendendo deveres de cautela exigíveis pelas condições de tráfego, atropela ciclista na faixa em que esse trafegava.

4. A fixação dos danos morais está subordinada à posição econômica do ofensor, à gravidade de sua culpa e às repercussões da ofensa, respeitada a essência moral do direito, motivos pelos quais, mantém-se o valor indenizatório quando respeitados tais requisitos.

5. Inocorre bis in idem em condenação simultânea de pensão alimentícia e previdenciária, pois suas naturezas são diversas. Tendo a vítima sofrido lesões permanentes, ela tem o direito de receber do ofensor pensão alimentar vitalícia a partir do acidente que a vitimou.

6. Objetivando o cumprimento da obrigação indenizatória, impõe-se aos réus a constituição de capital que assegure o adimplemento da pensão mensal vitalícia.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2013.088464-0, da comarca de Criciúma (2ª Vara da Fazenda), em que são apelantes Romel Magnus e Daiane Martins Borges, sendo apelado Adilton Cardoso Fernandes:

A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, negarprovimento aos recursos, nos termos do voto. Custas na forma da lei.

Presidiu a sessão o Exmo. Sr. Des. Trindade dos Santos e participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Desembargadores João Batista Góes Ulysséa e Gilberto Gomes de Oliveira.

Florianópolis, 7 de agosto de 2014.

 

Monteiro Rocha

RELATOR

 

Gabinete Des. Monteiro Rocha

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de ação indenizatória movida por Adilton Cardoso Fernandes, representado por sua companheira Andreza de Souza Pacheco, contra Romel Magnus e Daiane Martins Borges, em razão de danos decorrentes de acidente de trânsito.

Narrou que, em 28 de julho de 2008, por volta das 6:15 hrs, o autor Adilton Cardoso Fernandes, trafegava com sua bicicleta pela Avenida Universitária (SC 443), em Criciúma, indo em direção ao seu local de trabalho, quando foi atropelado pelo veículo conduzido pelo primeiro réu -de propriedade da segunda requerida -, que trafegava em alta velocidade e com os faróis apagados.

Afirmou que em razão dos ferimentos, foi conduzido ao Hospital São José, em Criciúma/SC, em estado de coma, submetendo-se a diversos procedimentos cirúrgicos.

Por tais fatos, requereu, liminarmente, a condenação dos réus ao pagamento de R$1.500,00 referentes às despesas hospitalares existentes até então, bem como ao pagamento de pensão mensal em valor equivalente a um salário mínimo. No mérito, postulou a condenação dos réus nos seguintes termos: a) pensão mensal em valor equivalente a 2,5 salários mínimos; b) danos morais em valor equivalente a 100 salários mínimos, ou outro a ser fixado judicialmente; c) danos materiais, consistentes nas despesas com enfermeiras, no valor de R$1.915,00.

A análise do pedido de antecipação de tutela foi postergada para após a contestação.

Devidamente citados, os réus contestaram arguindo, preliminarmente, carência de ação, por defeito de representação do autor. No mérito, afirmaram que não há provas da culpabilidade pelo acidente noticiado, alegando a culpa exclusiva do autor como excludente de responsabilidade, tendo em vista que este transitava com sua bicicleta no meio da pista quando foi atingido pelo réu condutor. Impugnaram as verbas pretendidas pelo requerente. Pleitearam, ao final, a improcedência dos pedidos iniciais.

Houve réplica (fls. 165-178), na qual o autor juntou aos autos, termo que nomeia Andreza de Souza Pacheco sua curadora.

Diante do documento de fl. 179 (termo de curadoria), o Ministério Público manifestou-se pela regularização da representação do demandante, o que foi atendido pelo autor.

Em audiência preliminar, restou inexitosa a conciliação.

Realizada audiência de instrução e julgamento, foram colhidos os depoimentos pessoais das partes e ouvida uma testemunha.

As partes apresentaram alegações finais.

O Ministério Público manifestou-se pela procedência dos pedidos iniciais, com reconhecimento de culpa concorrente.

Processado o feito, sobreveio sentença, na qual, o magistrado a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais.

Os réus interpuseram apelação.

Romel Magnus sustentou a nulidade da sentença pelo julgamento ultra e extra petita. Quanto ao mérito, disse que não há prova de sua culpa pelo evento danoso, invocando a culpa exclusiva da vítima como excludente de sua responsabilidade civil. Sucessivamente, pleiteou a redução do quantum dos danos morais e o afastamento da pensão mensal arbitrada em favor do autor.

Daiane Martins Borges arguiu, em preliminar, sua ilegitimidade passiva ad causam, em virtude da alienação do automóvel em data anterior ao acidente. Quanto ao mérito, sustentou que não há prova da culpa do condutor de seu veículo pelo evento danoso e que houve culpa exclusiva da vítima. Sucessivamente, pleiteou a redução do quantum dos danos morais e o afastamento da pensão mensal arbitrada em favor do autor.

O autor apresentou contrarrazões aos recursos.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Tycho Brahe Fernandes, manifestando-se pelo desprovimento do recurso do réu Romel Magnus; e pelo conhecimento parcial do recurso da ré Daiane Martins Borges, com o desprovimento da parte conhecida.

É o relatório.

 

Gabinete Des. Monteiro Rocha

 

 

VOTO

 

Conheço dos recursos, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de sua admissibilidade.

A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, condenando os réus nos seguintes termos:

 

1) danos morais no valor de R$70.000,00;

2) danos materiais no valor de R$640,00;

3) pensão mensal vitalícia a ser paga desde a data do acidente, em valor equivalente a um salário mínimo, acrescida de gratificação natalina (13º salário) e terço constitucional de férias;

4) constituição de capital que garanta o pagamento da pensão mensal.

 

Os réus recorreram alegando as seguintes matérias: a) ilegitimidade passiva ad causam da ré Daiane Martins Borges, proprietária do veículo acidentado, em virtude da alienação do automóvel em data anterior ao acidente; b) sentença ultra petita, em virtude da condenação por danos morais em valor superior ao pleiteado na inicial e pelo acréscimo da gratificação natalina e do terço constitucional de férias ao pedido de pensão mensal; c) sentença extra petita, em razão da condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos estéticos; d) culpa exclusiva da vítima pelo acidente de trânsito; e) redução do quantum dos danos morais; f) afastamento da pensão mensal em virtude do autor perceber aponsentadoria por invalidez; g) fixação de termo final para a pensão mensal na data em que o autor completar 65 anos de idade; h) afastamento da constituição de capital para garantir o pagamento da pensão mensal.

O autor não interpôs apelação.

Destaco que os recursos dos réus, apesar de interpostos individualmente, apresentam matérias coincidentes, motivo pelo qual serão analisados em conjunto.

1. Ilegitimidade passiva da ré Daiane Martins Borges

Argumenta a ré Daiane Martins Borges que é parte ilegítima ad causam para responder pelos danos impostos ao autor em decorrência do acidente de trânsito envolvendo o réu Romel Magnus, ao qual transferiu o veículo a este em data anterior ao acidente. Pretende com isso, a aplicação da Súmula 132 do STJ.

Sem razão a recorrente.

Em que pese a ré arguir sua ilegitimidade passiva ad causam somente em apelação, tal tese não pode ser considerada inovação recursal, pois as condições da ação, como é o caso da legitimidade de parte, constituem matéria de ordem pública, podendo ser arguídas a qualquer tempo nas instâncias ordinárias.

Não há nos autos qualquer documento comprovando que a requerida alienou o veículo envolvido no acidente em data anterior ao infortúnio. Aliás, sequer há indícios de que o veículo não mais lhe pertença. Tal prova lhe incumbia, a teor do que determina o art. 333, II, do CPC.

Neste contexto, deve ser mantida a sentença que declarou a legitimidade passiva ad causam da ré Daiane Martins Borges para responder solidariamente com o motorista do veículo (réu Romel Magnus) pelos fatos narrados nesta ação, pois ausente prova da alienação do veículo.

A propósito, em casos tais, é entendimento do TJSC que “o proprietário e o motorista do veículo envolvido em evento danoso respondem solidariamente pelos prejuízos decorrentes do ilícito” (TJSC, 5ª Cam. Dir. Civ., de minha relatoria, Ap. Civ. 2009.055281-2, de Santo Amaro da Imperatriz, j. em 20-9-2012).

Assim, incomprovada a alienação do automóvel acidentado, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam da ré Daiane Martins Borges.

 

2. Sentença extra e ultra petita

Argumentam os recorrentes/réus que a sentença é extra e ulta petita

pelos seguintes motivos: a) valor dos danos morais arbitrado em sentença em montante superior ao pleiteado na inicial; b) ausência de pedido acerca dos danos estéticos; e c) ausência de pedido expresso a respeito da gratificação natalina (13º salário) e do terço constitucional de férias.

O argumento de que a sentença condenou os réus ao pagamento de danos morais em valor superior ao pleiteado na inicial não convence.

Isso porque, extrai-se dos pedidos iniciais que o autor formulou requerimento meramente estimativo. Do pedido “c” (fl. 16), consta o seguinte: “a condenação dos réus ao pagamento a título de indenização pelo dano moral experimentado, no valor de 100 (cem) vezes o valor do salário mínimo, ou outro a ser arbitrado por Vossa Excelência” (grifei). Dessa forma, o valor ali constante foi meramente sugestivo, sem força vinculativa.

Não há nulidade em sentença que fixa os danos morais em valor acima do sugerido pelo autor na inicial, porquanto, inexistem critérios exclusivamente objetivos para mensurar a extensão do prejuízo sofrido, e o valor fixado decorre do livre arbítrio judicial fundamentado.

Quando chamado aos autos para resolver celeuma jurídica análoga à dos autos, o TJSC assim decidiu:

 

“O arbitramento do valor da indenização incumbirá ao juiz, que o fixará observando as peculiaridades do caso concreto, bem como as condições financeiras do agente e a situação da vítima, de modo que não se torne fonte de enriquecimento, tampouco seja inexpressivo a ponto de não atender aos fins a que se propõe. Não há falar em julgamento ultra petita se o valor arbitrado a título de indenização por dano moral é superior àquele postulado na inicial, por ser este meramente estimativo” (TJSC, 2ª Cam. Dir. Civ., Rel. Des. Mazoni Ferreira, Ap. Civ. n. 2004.021143-0, de Joinville, j. em 24-9-2009).

 

Em decorrência, afasta-se a nulidade arguida quanto a esse ponto.

 

No tocante à ausência de pedido expresso acerca dos danos estéticos, embora o demandante não tenha formulado pedido expresso nesse sentido, ao descrever na inicial os danos sofridos por si, incluiu os danos estéticos.

Da inicial, extrai-se o seguinte trecho:

“Como se percebe, a jurisprudência não destoa do sofrimento e da realidade vivenciada pelo autor no fato do acidente ocasionado pelo réu, e que lhe gerou até o presente momento a depreciação de sua vida e saúde, o dano moral experimentado, o dano estético, o dano material, além da redução na percepção de seus rendimentos de trabalhador em face da redução de sua capacidade laborativa” (grifei -fl. 14)

Utilizando-se a interpretação lógico-sistemática dos pedidos da inicial, tem-se que no pedido de danos morais de forma genérica, o autor pretendia englobar todos os danos extrapatrimoniais (inclusive os estéticos) de que foi vítima em virtude do acidente narrado, até porque a indenização deve ser a mais completa possível.

Conforme asseverou o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira “o pedido é aquilo que se pretende com a instauração da demanda e se extrai a partir de uma interpretação lógico-sistemática do afirmado na petição inicial, recolhendo todos os requerimentos feitos em seu corpo, e não só aqueles constantes em capítulo especial ou sob a rubrica ‘dos pedidos” (STJ, 4ª Turma, REsp n. 233446/RJ, j. 27-3-2001).

A sentença não fixou valor nominal para os danos estéticos (fls. 380/381), arbitrando valor único para estes e para os danos morais, corroborando a tese de que os danos estéticos estão incluídos nos danos morais.

Desta forma, afasta-se a alegação de julgamento extra petita, em virtude da ausência de pedido expresso de danos estéticos.

Por fim, sustentam os recorrentes que a sentença é ultra petita, pois, além de fixar a pensão vitalícia, condenou-os ao pagamento de 13º salário e terço constitucional de férias, sem que estes últimos fossem requeridos pelo autor.

Sem razão os apelantes.

Isso porque, tais quantias (gratificação natalina e terço constitucional de férias) estão implicitamente inseridas nos rendimentos auferidos pelo trabalhador. Aliás, a jurisprudência entende que “desde que a pensão faça parte integrante do pedido exordial, não se verifica julgamento ultra petita em sentença que sobre ela faz incidir o décimo terceiro salário e adicional de férias” (TJSC, 3ª Cam. Dir. Civ., Rel. Des. Marcus Túlio Sartorato, ACV n. 2006.008609-1, de Criciúma, j. 13-11-2007).

Trago aos autos entendimento jurisprudencial do TJSC que resolve situação análoga à presente:

“Na condenação imposta ao embargado a pagar mensalmente uma pensão vitalícia em favor da vítima, diante das sequelas decorrentes de acidente automobilístico, inclui-se, obrigatoriamente, o 13º (décimo terceiro) salário e o adicional constitucional de 1/3 das férias, ainda que esta última não esteja expressa na petição inicial, por tratarem-se de consectários lógicos da própria natureza da indenização” (TJSC, 2ª Cam. Dir. Civ., Rel. Des. Trindade dos Santos , Embargos de declaração em ACV n. 2009.053234-6, de Otacílio Costa, j. 14-2-2013).

Dessa forma, não é ultra petita a sentença que inclui no pedido de pensão mensal vitalícia, as verbas referentes à gratificação natalina e ao terço constitucional de férias.

Por tais motivos, afasto a alegação de nulidade da sentença.

Passo ao mérito da ação.

 

3. Responsabilidade Civil

Requerem os réus o afastamento de sua responsabilidade civil no caso concreto, sob o argumento de que a culpa pelo acidente foi única e exclusiva do autor, que conduzia sua bicicleta no meio da pista.

 

O dispositivo legal aplicável ao caso vertente é o do art. 186 do Código Civil vigente à época dos fatos, para o qual “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Para tanto, faz-se mister à procedência desta ação a constatação dos seguintes requisitos: a) ação ou omissão do agente; b) relação de causalidade; c) existência de dano; d) dolo ou culpa do agente.

Ato lesivo é toda ação ou omissão voluntária que viola direito ou causa prejuízo a outrem. Dano é toda lesão a bens ou interesses juridicamente tutelados, sejam de ordem patrimonial, sejam de ordem puramente moral (AGOSTINHO ALVIM, Da Inexecução das Obrigações e suas Conseqüências, Saraiva, 1972, p. 172). Nexo causal é um liame jurídico que se estabelece entre causa (fato lesivo) e conseqüência (dano), de uma tal maneira que se torne possível dizer que o dano decorreu daquela causa. Culpa, a seu turno, que em sentido amplo envolve o dolo, é a vulneração a um dever jurídico que possibilita a imputação do ilícito a alguém, em virtude da reprovação social daí decorrente.

Sustenta o autor que foi atropelado pelo automóvel dirigido pelo primeiro réu, quando conduzia sua bicicleta em direção ao trabalho; enquanto isso, os réus argumentam que a responsabilidade pelo infortúnio foi exclusiva do autor, pois transitava no meio da faixa de rolamento.

O Boletim de Ocorrência de fl. 27 não resolve a culpabilidade pelo acidente, tendo em vista que foi elaborado unicamente com base nas declarações do requerido Romel Magnus, tendo em vista que o autor estava inconsciente (fl. 29).

Neste sentido:

 

“Se o Boletim de Ocorrência elaborado pela autoridade policial não contém as versões de ambas as partes envolvidas no sinistro e tampouco conclusão fundamentada de quem causou o ilícito, não poderá servir como meio de prova”

(TJSC, 2ª Cam. Dir. Civ., Rel. Des. Mazoni Ferreira, Ap. Civ. n. 2000.005701-0, de Coronel Freitas).

 

Dessa forma, para dirimir a controvérsia fática, é necessário analisar os depoimentos colhidos na audiência de instrução e julgamento.

Transcreve-se trechos dos depoimentos pessoais das partes (CD-ROM de fl. 347):

 

-Adilton Cardoso Fernandes -autor: “[…] que trabalhava de bicicleta todo o dia; [..] que estava no canto da pista; […] que no momento do acidente estava escuro ainda; […] que a bicicleta tinha um “olho de gato” atrás da roda; […] ouviu que o réu freiou; […] que o réu estava correndo bastante; que o seu amigo que vinha logo atrás chamou os bombeiros, homem que trabalhava comigo; não lembra o nome do amigo […]”;

-Romel Magnus -réu condutor: […] que em uma segunda feira, por volta das 6 horas da manhã, estava indo buscar um funcionário da empresa no Bairro São Defende; […] que estava escuro, era inverno, final do mês de julho; que quando viu tinha algo, uma bicicleta na frente, no meio do asfalto; que deu uma freada, reduziu o que pode para evitar a batida, só que bateu, não conseguiu desviar; […] que ali onde estava não conseguiu encostar, pois ali praticamente não tem acostamento, é muito ruim, muito irregular; […] que não parou, pois não deu, que parou mais ou menos uns 200 metros para frente; […] que viu que tinha uma bicicleta no meio da estrada, do asfalto; que não encontrou a vítima, pois só tinha a bicicleta no meio da estrada; que tinha um declive ao lado de uns 4 ou 5 metros, que então a vítima estava “lá embaixo” que praticamente não tinha acostamento; […] que não havia iluminação, nada de iluminação, estava totalmente escuro; […] que não passou por cima do requerente, que a hora que bateu, a pessoa caiu, bateu no capô, não conseguiu identificar, mas alguma coisa caiu em cima do capô, e deve ter caído para o lado; […] que quando viu estava em cima, que tentou frear, que devia estar entre 50 ou 60 km/h, que tinha recém passado uma lombada e não tinha como estar em alta velocidade; que parou uns 200 metros a frente por que não tinha como parar no local, pois o acostamento é todo irregular; […] que a bicicleta não tinha nenhum tipo de luminosidade, não reparou, não percebeu […]”.

 

A única testemunha ouvida nos autos não presenciou o acidente, no entanto, descreve as condições em que este ocorreu. Veja-se:

 

-Valentim de Borba da Rosa: “[…] que o acidente ocorreu perto, a uns 200 metros de onde estava; […] que tem a estrada e do lado tem um barranco, não tem acostamento; […] que na hora que aconteceu o acidente estava escuro, que iluminação não tem; […] que quando foi até o local, a mais ou menos 50 metros conseguiu perceber que tinha uma bicicleta no asfalto; que só escutou o barulho, mas não sabe se tinha marca de freada […]”.

 

Dos depoimentos pessoais das partes, e da oitiva da testemunha, conclui-se que é fato incontroverso que na Rodovia SC-443, local em que ocorreu o acidente, não havia acostamento transitável.

 

O próprio réu afirma que, após o acidente, “não conseguiu encostar, pois ali praticamente não tem acostamento, é muito ruim, muito irregular” (CD-ROM de fl. 347). Dessa forma, se nem o réu conseguiu estacionar no acostamento com o seu veículo de grande porte e resistente (o réu Romel Magnus conduzia uma caminhonete), conclui-se que o autor também não conseguiria trafegar com sua bicicleta pelo acostamento.

 

Neste contexto, ante a ausência de acostamento transitável no local dos fatos, aplicável ao caso o art. 58, in fine, do CTB, que assim estabelece:

 

Art. 58. Nas vias urbanas e nas rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os veículos automotores.

 

É fato incontroverso que o autor trafegava com sua bicicleta pela faixa de rolamento no mesmo sentido do veículo conduzido pelo réu Romel, o que é admitido pelo réu. O autor trafegava regulamente com seu veículo (bicicleta) no espaço que lhe era destinado, quando foi colhido por trás pelo veículo do réu.

 

O boletim de ocorrência (fl. 13), embora não resolva a culpabilidade pelo acidente, traz as seguintes informações, que devem ser consideradas para a solução da culpabilidade: a) estava chovendo; b) estava escuro; c) não havia iluminação no local; e d) as condições de visibilidade eram ruins.

 

Percebe-se que no momento do acidente, as condições de visibilidade e climática da via não eram ideais -período noturno, chuvoso e ausência de iluminação -, o que demonstra que o réu deveria guiar seu veículo com maior diligência e cuidado.

 

Como bem salientou o procurador de justiça Dr. Tycho Brahe Fernandes “devido às condições climáticas e físicas da via relatadas acima, a situação requeria um cuidado especial por parte do condutor do automóvel, não somente pelo teor do artigo 43 do CTB, mas também pelo bom senso, precipuamente, quando às margens da pista transitavam ciclistas diariamente rumo ao seu trabalho” (fl. 508).

 

O dever de cautela exigiria que o veículo fosse conduzido em velocidade moderada e maior diligência, pois era perfeitamente previsível que veículo de menor

porte (bicicleta, por exemplo), ou até mesmo pedestre, por descuido ou necessidade, viesse a ingressar, ainda que parcialmente, sobre o leito da pista, tendo em vista que a rodovia não contava com acostamento.

 

No meio urbano a obrigação de diligência recai sobre o condutor do

veículo automotor, tanto em relação aos pedestres, quanto em relação a outros veículos menores de propulsão animal ou humana, como é o caso da bicicleta.

 

Esse mesmo dever de diligência recomenda que o motorista cauteloso mantenha previsibilidade sobre eventuais ingressos na pista de rolagem, como imperativo elementar do princípio da direção defensiva.

 

Se o réu estivesse conduzindo em velocidade compatível com as circunstâncias do local, o atropelamento da vítima poderia não ter ocorrido, ou, mesmo que tivesse ocorrido, o impacto não seria, em princípio, capaz de provocar graves sequelas, como foi o caso dos autos.

 

Considerando que o motorista estava com o farol aceso e a bicicleta possuía sinalização noturna lateral e no pedal (vide fl. 188), era possível ao réu avistar o autor a distância suficiente para evitar o acidente. Tal fato, entrelaçado com a previsibilidade de ciclistas trafegarem naquele local diariamente, demonstra que a melhor oportunidade de evitar o acidente era do réu, que tinha, ou deveria ter, perfeito domínio sobre a situação.

 

Sobre o assunto, trago aos autos entendimento que, mutatis mutandis, reputo aplicável ao caso vertente:

 

“A par de ausente provas a respeito da alegada falta de sinalização da bicicleta em que se encontrava a vítima, ainda que estivesse ela sem os equipamentos de segurança exigidos pela legislação de trânsito brasileira, qualquer parcela de culpa da mesma estaria arredada, posto terem sido a negligência e a imprudência do condutor do veículo automotor os fatores preponderantes para a ocorrência do sinistro” (TJSC, 2ª Cam. Dir. Civ., Rel. Des. Trindade dos Santos, Ap. Civ. 2009.053234-6, de Otacílio Costa, j. 20-9-2012).

 

Por todo o exposto, o desatendimento do dever de cuidado exigível, surge a culpa exclusiva do reú na modalidade da imprudência.

 

No entanto, no caso dos autos, a culpa concorrente deve ser mantida em razão da ausência de recurso do autor.

 

Assim, preenchidos os requisitos da responsabilidade civil subjetiva do réu, a conseqüência é a obrigação deste em ressarcir o autor pelos prejuízos suportados.

 

Inexistindo recurso dos réus questionando a solução da sentença para os danos materiais, passo à análise dos danos morais e do pensionamento mensal.

 

4. Do quantum indenizatório a título de danos morais:

Sustentam os réus apelantes que, reconhecida a culpa concorrente pelo acidente de trânsito, o montante arbitrado a título de danos morais deve ser reduzido a patamar proporcional às consequências do infortúnio.

 

Inicialmente, traz-se aos autos entendimento doutrinário classificando os direitos da personalidade em nosso sistema jurídico.

“Antes de adentrarmos nos direitos da personalidade, tentaremos preliminarmente, classificar os direitos fundamentais da pessoa humana.

 

“Podem estes ser distribuídos em duas grandes categorias: os direitos de

ordem social (ou de órbita pública)-e os de ordem civil, ou de órbita individual privada, que são, em última análise, os direitos da personalidade propriamente ditos, direitos específicos, atinentes às relações entre as pessoas naturais (o grifo é meu).

 

“Na primeira categoria encontramos três classes, os direitos à integridade física (correspondendo o direito à vida e saúde), à integridade moral, os direitos de segurança pessoal e finalmente os direitos sócio-políticos.

 

“Na segunda categoria -direitos de ordem civil -se situam precisamente os

direitos da personalidade propriamente ditos, ou seja das pessoas naturais, umas em relação às outras. Estes são por sua vez considerados sob duas classes, os direitos privados de ordem física, ou bio-física, e os de ordem moral” (José Serpa de Santa Maria, Direitos da Personalidade e a Sistemática Civil Geral, Campinas-SP, Julex Livros, 1987, pp. 36/37).

 

Os direitos personalíssimos abrangem, portanto, os direitos decorrentes de ordem física, bio-física e moral.

 

A pretensão deduzida na exordial é o recebimento de indenização por ofensa a direito da personalidade, consistente nas lesões permanentes de que o autor foi vítima, mais cirurgia e internação hospitalar.

 

Conforme ensinamento do professor Orlando Gomes, direitos da personalidade são aqueles constituídos pelos bens jurídicos a que se convertem as projeções físicas ou psíquicas da personalidade, por determinação legal que os individualiza para dispensar proteção. Recaem sobre manifestações especiais de suas projeções consideradas dignas de tutela jurídica, principalmente no sentido de que devem ser resguardadas de qualquer ofensa por necessário ao desenvolvimento físico e normal do homem (apud José Serpa de Santa Maria. Direitos da Personalidade e a Sistemática Civil Geral. Curitiba: Julex Livros, 1987, p. 33).

 

Raymond Lindon diz que a personalidade é para o indivíduo um conjunto incorpóreo formado de nome, patrimônio moral que a ele se liga; consideração da qual se julga merecedor; aspecto físico de sua pessoa, principalmente de sua fisionomia; aspecto não exclusivamente patrimonial de sua produção intelectual; e, por fim, a manifestação de alegria de sua vida privada (Cf. LINDON, Raymond. “Les dispositions de la loi du 17 juillet 1970 relatives à la protection de la vie privée.

Jrisclasseur périodique [La semaine juridique] Paris, II, 2.357, 1970).

 

Sobre danos morais ensina WILSON MELO DA SILVA, em Do Dano Moral e sua Reparação, 2. ed., Forense, pp. 424 e 427: “Na ocorrência da lesão manda o direito ou a eqüidade que se não deixe o lesado ao desamparo de sua própria sorte. E tanto faz que tal lesão tenha ocorrido no campo se seus bens materiais ou na esfera daqueles outros bens seus, de natureza ideal. O que importa, o que é mister, é a reparação, pelo critério da equivalência econômica, num caso, ou pelo critério da simples compensação, da mera satisfação, como o queiram, no outro”.

 

Os danos morais em sentido amplo abrangem os prejuízos biológicos, os estéticos e os anímicos (morais stricto sensu).

 

Os danos anímicos (morais em sentido estrito) consistem em dissabores, angústias ou constrangimentos psíquicos.

 

Os danos biológicos, ainda inseridos no conceito amplo de danos morais, decorrem da perda ou da redução da funcionalidade somática do corpo humano ou de parte dele.

 

Requerem os apelantes a redução dos danos morais arbitrados em R$70.000,00 (setenta mil reais).

 

Sem qualquer lastro de dúvida, o autor Adilton Cardoso Fernandes sofreu danos morais e estéticos, pois segundo consta do laudo médico pericial de fl. 305, o autor, “sofreu lesão cerebral a esquerdo comprometido todo o lado direito do corpo, ficando com dificuldade para falar, problemas oculares a direito e paralisia do membro superior direito e membro inferior direito” (fl. 305).

 

Além disso, o requerente “foi submetido à cirurgia de crânio (craniotomia temparo frontal parietal à esquerda) e conforme informação de sua curadora foi

submetido a uma nova cirurgia de crânio complementar a primeira cirurgia” (fl. 306).

 

Atestou o laudo pericial ainda, que as lesões do autor são permanentes e que o tornaram dependente de auxílio de terceiro para sua higiene pessoal, para vestir-se e alimentar-se, enfim, para todos os atos cotidianos.

 

As graves lesões sofridas pelo autor são física e mentalmente incapacitantes, o que obrigou, inclusive, a nomeação de curadora para representação de seus atos na vida civil (fl. 179).

 

Considerando tal contexto, entendo que o valor indenizatório fixado no juízo a quo a título de danos morais corresponde às sequelas que vitimaram o autor.

 

Após o fatídico episódio, o autor restou impossibilitado de gerir sua vida, não podendo trabalhar, estando com o lado direito de seu corpo paralisado, o que o impossibilita de exercer qualquer atividade que garanta sua subsistência, não podendo, dessa forma, sentir-se útil à sociedade, o que, sem dúvidas, ocasiona sofrimentos diários que somente ele pode mensurar.

 

Com efeito, aos membros inferior e superior direito do requerente restaram sequelas permanentes, o que lhe ocasiona sérios transtornos ao convívio cotidiano com as demais pessoas, porquanto encontra-se dependente de terceiros, embora isolado psicologicamente.

 

O caso dos autos evidencia a essência do dano moral, porquanto os danos enunciados caracterizam-se como os mais importantes que o legislador constituinte buscou escudar ao criar o instituto reparatório.

 

Por essas razões, o valor dos danos morais fixado na sentença, mesmo considerada a culpa concorrente, é ínfimo diante dos sofrimentos narrados, numa relação de proporcionalidade e razoabilidade, motivo pelo qual, ausente recurso do autor para majorar o quantum, mantém-se o valor de R$70.000,00 (setenta mil reais), cabendo aos réus o pagamento da metade do aludido valor -R$35.000,00 -em favor

do requerente.

 

5. Pensão mensal

Requerem os apelantes o afastamento da pensão mensal fixada em favor do autor, sob o fundamento de que o requerente irá perceber benefício previdenciário do INSS em razão de sua invalidez permanente, o que afasta sua necessidade de alimentos. Além disso, pretendem o afastamento da gratificação natalina e do terço constitucional de férias, em razão de inexistir pedido expresso do requerente nesse sentido, e a fixação de termo final para o pensionamento.

 

Sem razão os recorrentes.

 

Mesmo provado que o autor percebe benefício previdenciário (prova essa que não existe nos autos), tal fato não influenciaria na análise do pedido de pensão mensal formulado nesta ação indenizatória.

 

Isso porque, consoante reiterada jurisprudência desta Corte de Justiça, a responsabilidade civil e a previdenciária são independentes, sendo possível sua cumulação.

 

Neste sentido:

 

“Possível a cumulação da pensão alimentícia decorrente de responsabilidade civil com a previdenciária, pois suas naturezas são diversas” (TJSC, 4ª Cam. Dir. Civ., de minha relatoria, Ap. Civ. n. 2007.010314-9, da Capital, j. 26-6-2008).

 

A propósito, traz-se aos autos entendimento jurisprudencial que entendo aplicável ao caso vertente:

 

“Indenização por ato ilícito não se confunde com pensão enquanto benefício previdenciário (REsp 811.193/GO, Min. Rel. Jorge Scartezzini, 4ª T., DJ 6-11-2006).

 

A indenização reconhecida em sentença representada por pensão mensal vitalícia devida a quem teve reduzida a capacidade laborativa, tem caráter personalissímo, perdurando enquanto vivo o seu titular” (STJ -RT 864/197: 1ª T., RMS 21611).

 

Dessa forma, inacolhe-se o afastamento dos alimentos civis, sob o fundamento de que o autor irá perceber benefício previdenciário do INSS, tendo em vista que a responsabilidade civil é independente da previdenciária.

 

No tocante ao afastamento da gratificação natalina e do terço constitucional de férias do pensionamento, em virtude da inexistência de pedido expresso do autor nesse sentido, tem-se que tal tese foi analisada anteriormente (item 2 deste acórdão), concluindo-se que tais verbas estão implicitamente incluídas na pensão mensal, motivo pelo qual, afasto esse argumento.

 

Por fim, a alegação de que a pensão deve ter termo final na data em que a vítima complete 65 anos de idade não merece prosperar.

Em decorrência do acidente de trânsito provocado pela requerida, o autor sofreu “paralisia do membro superior direito e inferior direito, impossibilitando-o a exercer algum trabalho que garanta sua subsistência” (Laudo pericial -fl. 306). Além disso, o mesmo laudo afirma que a incapacidade é permanente.

Neste contexto, sendo permanentes as lesões incapacitantes sofridas pelo autor, o pensionamento deverá perdurar enquanto a vítima viver, porque “a pensão por incapacidade permanente, cujo termo inicial é a data do evento danoso, é vitalícia, pois a invalidez total ou parcial para qualquer atividade laborativa acompanhará o lesado ao longo de toda a sua vida” (STJ -3ª Turma., Rel. Min. Tarso Sanseverino, AgRg no REsp n. 1295001/SC, j. 25-6-2013).

Dessa forma, mantenho a pensão mensal nos termos da sentença a quo -salário mínimo vitalício, a partir do acidente, mais a incidência de décimo terceiro salário anual e terço constitucional de férias, de cujo montante final os requeridos deverão pagar, em favor do requerente, 50% do total integralizado.

6. Constituição de capital No tocante à constituição de capital, requerem os apelantes o afastamento de tal determinação.

Conforme artigo 475-Q do Código de Processo Civil, nas indenizações por ato ilícito que incluírem a prestação de verba alimentar, ordena-se o devedor a constituir capital que assegure o pagamento da dívida.

Segundo Theotonio Negrão, “nas ações indenizatórias, o objetivo de constituir-se um capital é o de dar à parte lesada a segurança de que não será frustrada quanto ao efetivo recebimento das prestações futuras a que faz jus” (Código de Processo Civil e Legislação Processual em vigor, 40. ed., Saraiva: São Paulo, 2008, p. 606)

De acordo com a Súmula 313 do Superior Tribunal de Justiça “em ação de indenização, procedente o pedido, é necessária a constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia de pagamento da pensão, independentemente da situação financeira do demandado” (grifei)

Como bem salientou o procurador de justiça Dr. Tycho Brahe Fernandes

“eventual incapacidade financeira dos apelantes não é fundamento hábil a excluir a obrigação de constituição de capital para garantir o pagamento de pensão indenizatória devida e, por consequência, a eficácia jurídica da prestação […]” (fl. 512)

Não há elementos probatórios que indiquem as condições econômicas dos réus, o que não afasta a necessidade de constituição de capital, cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da pensão.

Assim, mantém-se a obrigação dos réus de constituírem capital para

assegurarem o direito creditício do autor em 50% sobre o total da verba liquidada pelo senhor contador judicial, conforme a norma inserta no art. 475-Q do CPC.

Ante o exposto, nego provimento aos recursos dos réus.

É o voto.

Gabinete Des. Monteiro Rocha