Canal Aberto N° 01
Pedal Materno, prazer ou uma necessidade?
Por Melissa Noguchi
A pergunta puxa uma reflexão sobre a vivência das mães nas cidades, com destaque para a forma que se deslocam.
Aproveitando o mote do Dia Internacional da Mulher, vale levar em consideração que esse recorte somado à chegada de uma criança afeta de diversas maneiras a rotina e a vida do núcleo familiar, mas especialmente as mães, que agregado aos diversos enfrentamentos enquanto mulher também assume a sobrecarga da responsabilidade da vida da criança no nosso contexto de sociedade machista e patriarcal.
Pesquisas e contagens de ciclistas demonstram que mulheres pedalam menos nas cidades, no entanto, a maioria das mulheres que pedalam, utilizam a bicicleta para levar os filhos para a escola ou para ir ao mercado. Observa-se, portanto, que a utilização da bicicleta por essas mulheres, principalmente as que residem na periferia, se dá pela necessidade financeira, assim como pela praticidade do modal.
Os desafios dessa mulher-mãe vão muito além da responsabilidade com a criança, mas também da falta de políticas públicas voltadas para a assistência e o suporte ao maternar com tranquilidade. Agregado a esses entraves existem os desafios para exercer o direito à cidade e acessar o espaço urbano. De bicicleta a situação é potencializada. As áreas periféricas não contam com infraestrutura cicloviária, para que mães possam realizar seus trajetos com segurança e tranquilidade acompanhada da(s) criança(s).
As cidades são planejadas e desenvolvidas a partir de padrões que só reforçam as desigualdades de gênero, raça e classe. Sobretudo nos últimos anos, com o atual governo federal, que vem desqualificando e reduzindo a agenda do direito à cidade, ao transporte, entre outros. A maior parte dos espaços do sistema viário das nossas cidades é pautada no carro.
Portanto, há de se ter um olhar empático e especial a estas mulheres. Há anos se fala sobre os conceitos de cidades seguras, na qual o planejamento deveria ocorrer a partir da perspectiva de mulheres, crianças e idosos.
Considerando que uma cidade segura para estas pessoas será uma cidade segura para toda a população.
Para além desta percepção é importante observar também sobre outro viés: o da mulher que utiliza a bicicleta por lazer. Esta mulher que, a partir do momento que se torna mãe tem essa atividade de lazer, muitas vezes, prejudicada. Entre os motivos desse prejuízo temos alguns já mencionados no texto, como o sistema patriarcal que vivemos, mas também a falta de empatia por parte de quem promove, organiza ou realiza atividades de lazer com bicicleta. O ritmo, o formato e as atividades, não habilitam essa mãe para estar ali com sua criança ou não há rede de apoio que ofereça espaço para o lazer da mãe, que muitas vezes precisa de qualidade de vida, na qual o lazer também se torna parte essencial para essa mulher.
Foto: Instagram do Ciclomobilidade Pará (Belém-PA- 2018)
Pensando nisso, em Belém, o Pedala, Mana!, grupo de feministas e ativistas de bicicleta criou a atividade Pedala MaMa, pensando nas mães que não conseguiam ajustar a rotina para estarem presentes nos encontros semanais noturnos das mulheres.
É necessário que pensemos em formatos de atividade e eventos que promovam a mobilidade, também possibilitando a participação desse binômio mãe-filho, que nem sempre conta com rede de apoio. Muitas vezes esse grupo pode se tornar a própria rede de apoio dessa mulher, que não precisa e não deve criar, educar e cumprir com as responsabilidades sobre a vida dessa criança sozinha, como bem afirma o provérbio Africano: “É preciso uma aldeia para se educar uma criança”.