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30 de junho de 2013

44 – COLISÃO ENTRE VEÍCULO AUTOMOTOR E BICICLETA. Se “parou e olhou para os lados”, não se acautelou devidamente para a travessia

Apelação Cível Décima Segunda Câmara Cível
Nº  70039170568 Comarca de Canoas
ANDRESSA BROZOVITZKI MACIEL APELANTE
RODRIGO VARGAS DE ALMEIDA APELADO

ACÓRDÃO

 

           Vistos, relatados e discutidos os autos.

           Acordam os Magistrados integrantes da Décima Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo.

           Custas na forma da lei.

           Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des. Umberto Guaspari Sudbrack (Presidente) e Dr. Victor Luiz Barcellos Lima.

           Porto Alegre, 27 de junho de 2013.

DES.ª  ANA LÚCIA CARVALHO PINTO VIEIRA REBOUT,

Relatora.

RELATÓRIO

Des.ª  Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout (RELATORA)

           Trata-se de apelação interposta por Andressa Brozovitski Maciel, inconformada com a sentença que, nos autos da ação de indenização por reparação de danos pessoais, morais e materiais ajuizada por Rodrigo Vargas de Almeida, julgou procedentes os pedidos formulados, nos seguintes termos:

    Diante de tais considerações, merece acolhida a pretensão do autor, devendo ser rejeitada a reconvenção.

    Isso posto, JULGO PROCEDENTE o pedido do autor, condenando a R. ao pagamento dos valores relacionados com os danos materiais (fls. 44/50), devidamente corrigidos pelo IGP-M e acrescidos dos juros legais a contar dos respectivos desembolsos e também condenando a R. ao pagamento de indenização por danos morais, estes fixados em R$ 8.000,00 (oito mil reais), sendo os valores devidamente corrigidos pelo IGP-M e acrescidos de juros legais a contar da data do fato (Julgados 81/311 e 87/389 e Súmulas n.ºs 43 e 54, do STJ).

    JULGO IMPROCEDENTE a reconvenção.

    Sucumbente, caberá à R. a integral satisfação das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 900,00 (novecentos reais), atento ao contido no art. 20, §3º, do CPC, com a correção pelo IGP-M e juros de mora da citação.

    Todavia, diante da concessão do benefício à autora (fl. 70), suspendo os pagamentos relacionados à sucumbência, na forma do art. 12, da Lei nº 1.060/50.

    Registre-se.

    Intimem-se.

           A apelante, em suas razões de apelo, aduz que o autor concorreu com culpa exclusiva para o abalroamento da sua bicicleta contra o veículo da ré, haja vista esse não ter adotado as cautelas mínimas necessárias para atravessar a rua, tendo sido o único causador do acidente e dos danos daí advindos, razão pela qual não pode a demandada ser condenada ao pagamento de qualquer indenização.

           Pede seja provido o recurso, julgando-se improcedente a demanda intentada.

           Sobrevieram contrarrazões de apelo, pela manutenção da sentença.

           Subiram os autos a este grau de jurisdição, vindo a mim conclusos para julgamento.

           Foram cumpridas as formalidades do art. 551 do Código de Processo Civil.

           É o relatório.

VOTOS

Des.ª  Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout (RELATORA)

           Colegas.

           Tratam os autos de ação de indenização por danos materiais e morais decorrentes de acidente de trânsito ocorrido em 04 de outubro de 2005, na Avenida Mauá, na cidade de Canoas, ocasião em que o autor, trafegando com sua bicicleta, foi atingido pelo veículo Ford/Fiesta CLX, placas CIH 5352, de propriedade da demandada e conduzido por essa.

           O acidente envolvendo a bicicleta e o automóvel, bem como os danos impingidos ao autor e o nexo causal, na hipótese, são incontroversos, tangendo a controvérsia, unicamente, a culpa para a ocorrência do sinistro.

           O demandante imputa à apelada a culpa exclusiva pelo infortúnio, asseverando que o acidente somente ocorreu em razão de que a ré, “ao ultrapassar um caminhão que estava estacionado na rua Mauá e, por estar em velocidade muito acima do permitido no local que é de 40 km/h, agiu de forma imprudente e negligente, causando o acidente”.

           A ré, em sua defesa, argumenta que conduzia seu veículo pela Avenida Mauá, cuidadosamente, no sentido Leste-Oeste, sendo que no momento “em que ultrapassava a esquina da Loja Maria Móveis, por de trás de um caminhão (carreta), que deslocava ao seu lado e em sentido contrário (Oeste-Leste), repentinamente e sem o menor cuidado, surgiu o ciclista a sua frente, tentando atravessar a avenida”.

           Em reconvenção, a ré postulou a condenação do reconvindo ao pagamento de reparação por danos morais e materiais deflagrados com o acidente.

           A sentença julgou procedentes os pedidos articulados na inicial e improcedente a reconvenção intentada, motivo de interposição do presente recurso por parte da demandada, o qual passo a enfrentar, mas não sem antes esclarecer que a matéria devolvida restringe-se à negativa de culpa e ausência de dever de indenizar, não renovando a ré sua pretensão reconvencional.

           A prova oral colhida, que analisei detidamente, conforta, as testemunhas indicadas pelo autor, a seu turno, e aquelas arroladas pela ré, de sua parte, a tese sufragada por cada litigante, respectivamente.

           Desta forma, dúvida não há de que os depoimentos colhidos são colidentes e não oferecem meio para que se acolha um em detrimento do outro, como se baseou a sentença.

           Ante a dúvida instransponível que assoma diante das declarações testemunhais, deixando clara a sua percepção subjetiva do acontecimento, sobretudo considerando que a dinâmica de um acidente de trânsito se dá celeremente e as pessoas que estão presentes  no cenário dos fatos, nem sempre, têm os seus sentidos despertados para o mesmo detalhe, os únicos dados objetivos (e, por isso, seguros) que obtenho do conjunto probatório são a alta velocidade do Fiesta, no mínimo, incompatível para o local e circunstâncias, denotando a imprudência da motorista/ré,  e a falta de cautela do próprio ciclista.

           Justifico.

           A ré não nega que, no momento, estivesse chovendo, estando a pista molhada e escorregadia (sic, contestação, fl. 91).

           Desta forma, não apenas deveria dirigir cautelosamente, como a velocidade máxima para o local (40km/h) deveria ser mitigada/relativizada (ao menos reavaliada), ante a condição excepcional constatada, chuva e más condições de trafegabilidade.

           Como é consabido, o agir culposo não se revela apenas diante da transgressão da norma positiva de conduta (velocidade máxima de 40km/h), mas em virtude da violação da norma de conduta exigível do homem médio ante as condições e circunstâncias fáticas.

           Não é o que indica a prova documental adunada ao feito (fotografia de jornal, fl. 101), em que se percebe o estado do Fiesta após o sinistro, dando crédito a quem falou que o automóvel dirigido pela ré transitava em velocidade excessiva, impedindo à demandada evitar o acidente, ou, no mínimo, minimizá-lo.

           Quanto ao autor, sabedor de que estava na condução de um frágil veículo (bicicleta), mas que, nem por isso, desobrigava-se do respeito às mesmas normas que regram (disciplinam) o trânsito de veículos, deveria ele se sobreacautelar ao empreender a travessia da movimentada artéria.

           É o autor ele próprio que informa, fl. 91 :

Estava naquele exato momento tentando fazer a travessia da mão de direção em que se encontrava para o outro lado rua Mauá  que é a mão de direção Centro/Bairro. O veículo da ré Fiesta estava transitando pela mesma rua Mauá, no sentido Centro/Bairro.

           Tal comportamento é corroborado pela testemunha Amarildo Santos Freitas, arrolada pelo apelado:

Relata que os dois estavam transitando de bicicleta pela calçada no sentido Centro/Bairro da Rua Mauá, sendo que o ciclista autor parou e olhou para os lados e em seguida ele empreendeu o início da travessia de um lado para o outro da rua.

           Ora, se “parou e olhou para os lados”, não se acautelou devidamente como exigiam as normas de prudência recomendáveis para o sucesso da manobra intentada.

           Nesse passo, imperativo que se reconheça a culpa concorrente entre autor e ré, em idêntica proporção, respondendo a demandada por 50% (cinquenta por cento) dos danos causados ao apelado.

           Examino as rubricas condenatórias.

           Dos danos materiais.

           As despesas materiais experimentadas pelo autor com o conserto da sua bicicleta restaram comprovadas nos autos e atingem o valor total de R$ 277,90 (vide notas fiscais encadernadas na fl. 44).

           O autor teve, ainda, gastos com medicamentos, ataduras e aluguel de muletas, demonstrados nas fls. 45-50, e cujos valores e datas de compra vão a seguir discriminados:

Valor Data da compra
R$ 8,20 23/10/05
R$ 17,90 29/10/05
R$ 9,80 16/10/05
R$ 22,81 20/10/05
R$ 6,00 23/10/05
R$ 20,95 15/10/05
R$ 7,00 Sem data
R$ 65,00 15/10/05
TOTAL R$ 157,66

 

           No ponto, sublinho que, não obstante a ausência de impugnação específica da ré, observo que foram acostadas ao feito notas fiscais repetidas, e que, por isso, não merecem ser computadas.

           Depreende-se, por exemplo, das fls. 47, 48 e 49, a juntada de 1ª, 2ª e 3ª vias da nota fiscal no valor de R$ 20,95, emitida em 15/10/05; repetição da nota no valor de R$ 6,00, emitida no dia 23/10 e, ainda, duplicidade de notas no valor de R$ 9,80, cuja emissão é datada de 16/10/05.

           Assim, o valor total desembolsado pelo autor importa a quantia de R$ 435,56 e não de R$ 501,42, como postulado na inicial.

           Deste modo, o valor a ser indenizado pela ré  a título de danos materiais corresponde a R$ 217,78 (metade do valor de R$ 435,56 – que compreende a soma do valor do conserto da bicicleta e dos gastos com medicamentos).

           Dos danos morais.

           Os documentos acostados ao processo revelam a extensão dos ferimentos provocados no autor, sendo desnecessário conjeturar o quanto de abalo moral deve ter experimentado.

           Rodrigo ficou internado no Hospital Nossa Senhora das Graças de 04/10/05 (dia do acidente) até 11/10/05, data em foi transferido para o Hospital de Campo Bom, a fim de submeter-se a cirurgia no fêmur, de onde recebeu alta no dia 15/10/05.

           Considerando o quadro acima descrito, dúvidas não restam de que o autor experimentou momentos de angústia e de padecimento físico, que evidentemente devem ser indenizados.

           Relativamente ao valor da indenização, atenta a precedentes desta Câmara em hipóteses do gênero e reconhecendo a culpa concorrente do demandante, mantenho a quantia fixada na sentença (R$ 8.000,00), que equivale a aproximadamente 15 salários mínimos da data da sentença.

           Em razão do exposto, o meu voto é pelo parcial provimento do recurso, ao efeito de, em se reconhecendo a culpa concorrente das partes para a ocorrência do sinistro, julgar parcialmente procedente a ação ajuizada, condenando a ré ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 217,78 e de danos morais no valor de R$ 4.000,00, devidamente atualizadas da forma disposta na sentença.

           As custas do processo serão suportadas meio a meio.

           A demandada pagará honorários ao advogado do autor de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação total atualizada (danos materiais e morais), sopesadas as diretrizes do art. 20, §3º e alíneas do CPC.

           O autor, que decaiu em parte do pedido, suportará  honorários de R$ 1.000,00 (mil reais) em prol do advogado da ré, ante as diretrizes do art. 20, §4º, do mesmo diploma processual.

           Resta suspensa a exigibilidade do pagamento dos encargos sucumbenciais afetos ao autor, haja vista este litigar sob o pálio da assistência judiciária gratuita (fl. 51).

           Compensam-se os honorários advocatícios, na forma da Súmula n. 306 do STJ.

           É o voto.

Dr. Victor Luiz Barcellos Lima (REVISOR) – De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Umberto Guaspari Sudbrack (PRESIDENTE) – De acordo com o(a) Relator(a).

DES. UMBERTO GUASPARI SUDBRACK – Presidente – Apelação Cível nº 70039170568, Comarca de Canoas: “DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME.”

Julgador(a) de 1º  Grau: MOZART GOMES DA SILVA