Concurso de fotografia apresenta as diversas perspectivas do uso da bicicleta no país
Concurso de fotografia apresenta as diversas perspectivas do uso da bicicleta no país
Por Melissa Noguchi para Revista Bicicleta
Segunda edição do Concurso Imagens Cíclicas, promovido pela União de Ciclistas do Brasil, movimenta o cenário da mobilidade por bicicleta
Resgatar memórias da infância e ao mesmo tempo registrar um processo de mudança social, estrutural e comportamental. Foi com essa mensagem capturada em uma imagem que a ciclista e fotógrafa amadora Thais Lacerda conquistou o primeiro lugar do concurso de fotografia ‘Imagens Cíclicas’, na categoria Paisagem em Duas Rodas. O concurso foi promovido pela União de Ciclistas do Brasil e está em sua segunda edição.
Lacerda conta que a fotografia premiada teve como proposta registrar um espaço ao lado de onde cresceu, pelo fenômeno da movimentação do local. “Lá ocorreu um fenômeno que pude acompanhar por bastante tempo. Durante a pandemia lá era um local onde as pessoas iam para se refugiar, por ser um espaço aberto e seguro. Ficavam dentro dos carros para assistir ao pôr-do-sol ou faziam pic-nic. Ao terminar a pandemia houve uma valorização imobiliária por conta do fluxo de pessoas e o lugar acabou se tornando um espaço público e de lazer”. Lacerda conta que fez um memorial fotográfico do que aconteceu no terreno, que inclusive já foi vendido para implementação de novos empreendimentos o que, possivelmente, acabará com o uso público feito até então.
“A foto foi feita em um domingo, vi essa cena e estava um dia bonito, era inverno, o céu estava lindo. A imagem me remeteu muito à minha infância. Comecei a andar de bike aos 5 anos e aprendi sozinha. Lá era um lugar onde eu sempre pedalava e me intrigava muito a visão que o terreno dava para a cidade. A imagem da premiada, além de apresentar o contexto de mudança do uso de um espaço, também sugere o processo de debate sobre o direito à cidade.
Além da categoria Paisagem em duas Rodas, o concurso abordou outras sete, que possibilitaram olhares diversos sobre a mobilidade por bicicleta, como Cicloviagem, Ciclismo Urbano, Ciclismo Esportivo, Mulheres no Pedal, Cicloativismo e Identidades. O Cicloativista Uirá Lourenço, premiado em 1º lugar nas categorias Ciclismo Urbano e Identidades trouxe em seus registros o aprofundamento do debate sobre os problemas da mobilidade nos grandes centros urbanos, mas também a vulnerabilidade de um trabalhador que exerce papel fundamental na sociedade. “Foi uma cena ao mesmo tempo forte e impactante, triste e emblemática dos problemas de mobilidade em plena Capital Federal. A foto do eixão, onde centenas de pessoas sofrem na travessia”, conta.
Segundo Lourenço, o lugar passou por obras e, segundo o modelo carrocêntrico, o foco principal da obra foi para garantir a fluidez dos carros. “Houve ampliação da pista e nenhuma melhoria para quem atravessa esse local. A foto mostra um catador de latinhas, uma pessoa que já vivencia uma situação de vulnerabilidade e essa questão adicional de insegurança dos carros, presta serviço como agente ambiental e está sujeito a um grande risco”, finaliza.
O ciclista utiliza a bicicleta há mais de 20 anos. Toda a família pedala para se deslocar diariamente para escola e trabalho. Para ele, bicicleta é sinônimo de liberdade e enfrentamento. “Não só é um meio de transporte, mas é uma forma de liberdade, de exercer cidadania, sempre pedimos melhorias ao governo. É outro olhar da cidade, de apreciar a natureza, de construir relação mais amigável com pessoas, a possibilidade de poder parar em qualquer lugar ou a qualquer momento.
O livre ir e vir também foi destaque da fala da Leilane Maia, que ganhou o 1º lugar na categoria Mulheres no Pedal. Para ela, a bicicleta é essa ferramenta de liberdade feminina. Com a imagem intitulada de Passar (ela), a fotógrafa conta que registrou o seu olhar sobre o processo de encorajamento feminino. “Eram duas mulheres pedalando a noite e é uma situação de “perigo”, porque não é seguro pedalar no Brasil, em uma capital. Duas mulheres na rua pedalando é sinal de coragem e determinação, ao pedalar à noite, contrariando esse medo das pessoas e das mulheres de sair”.
Ela conta que o registro foi feito durante o pedal com a amiga, que foi sua maior incentivadora e encorajadora no momento de ocupar a cidade e as ruas. “A amiga que estava comigo e que compõe a imagem, me levou para andar de bicicleta em lugares que eu tinha receio de andar sozinha e ela representa uma mulher corajosa que pedala a noite e anda de bicicleta pela cidade. Ela representa liberdade, coragem e ousadia para andar por lugares considerados pouco habitados por mulheres.
Maia também utiliza a bicicleta como seu único meio de transporte e é fotógrafa. Para ela, a possibilidade de unir bicicleta e fotografia é uma iniciativa excelente da UCB. “O concurso traz visibilidade para a causa da bicicleta, fomenta o ambiente político sobre a bicicleta, faz com que as pessoas enxerguem a bicicleta como fotografia e por outros olhares”, afirma.
Na Categoria Ciclismo Esportivo, a imagem premiada foi de Myrian Lima, fotógrafa e ciclista. Ela conta que possui uma relação profunda com as duas atividades e isso trouxe a sensibilidade no olhar para eternizar o momento. “A arte alimenta a alma e o ciclismo nos traz qualidade de vida. Duas atividades que podem se complementar contribuindo para uma vida mais saudável. O primeiro lugar na Categoria Ciclismo Esportivo pra mim representa o esforço, a superação do ciclista em lograr suas metas”.
Lima também obteve o 1º lugar na categoria Cicloativismo, com a imagem intitulada ‘Respeito’. O registro foi feito durante uma ação na cidade de Natal. “A frase colocada nas costas de uma colega, que dizia ‘Troquem a pressa pelo respeito! Não tirem as nossas vidas’, resume tudo aquilo pelo qual lutamos, nossa segurança no trânsito. Não poderia deixar de fotografar”, afirma.
Nos diversos usos da bicicleta que o concurso pode apresentar, a cicloviagem também se destaca como categoria, garantindo também a leveza e o acesso à paisagens e momentos que apenas os cicloturistas podem vivenciar. É isso que o registro da imagem de Fernanda Alves, vencedora do 1º lugar da categoria Cicloviagem, garante. Ela e o namorado saíram de Pelotas, Rio Grande do Sul, para a primeira cicloviagem, em abril de 2020, no auge da pandemia. “Nossa ideia inicial era ir para o Uruguai, mas como as fronteiras estavam fechadas, decidimos sair sem saber muito bem para onde. Apenas me organizei pelo mapa onde passaríamos através da “estrada do inferno” e fomos. Esse lugar é muito especial pra nós pois ele nos surpreendeu. No dia que chegamos à Lagoa do Bacupari, no litoral médio do RS, era noite.
Fernanda relata que a entrada da localidade estava escura, mas ao seguir viagem chegaram ao ponto onde foi feita a foto. “Após descobrir esse lugar mágico, antes de darmos continuidade à viagem, levamos as bikes para ‘assistir’ esse nascer do sol na Lagoa. A escolha da foto foi fácil e difícil ao mesmo tempo, pois rendeu várias ‘poses’ das gurias (bikes). Realmente elas estavam muito fotogênicas nesse momento”.
De acordo com Erica Telles, coordenadora do GT de comunicação da UCB, a segunda edição do concurso contou com mais de 80 inscritos de todas as Regiões do Brasil. A manutenção da iniciativa tem como foco trabalhar a cultura da bicicleta através do viés artístico. “O concurso trabalha a perspectiva da cultura da bicicleta revelando diferentes imagens das pessoas que utilizam a bicicleta ou da própria bicicleta em cenários distintos, diversos e mostrando a sua diversidade, de como ela pode ter diferentes usos e realmente ser uma ferramenta de transformação social, pode ser uma forma de gerar emprego e renda, gerar autonomia, gerar uma situação de combate à imobilidade”.
O concurso garante para além de um olhar cuidadoso das pessoas que trazem essas fotos artística, poético, ou até mesmo de denúncia, mas também apresenta uma diversidade de despertar de olhares e emoções sobre a bicicleta. “É muito rico, no aspecto de fazer essa promoção da cultura da bicicleta e isso é um dos objetivos da UCB, então acredito que essa é uma das grandes potencialidades. Compartilhar isso com o público de uma maneira geral, a oportunidade da gente partilhar olhares”, afirma Telles.
Sobre o Concurso
Imagens Cíclicas ocorre anualmente, durante o final do segundo semestre do ano e é aberto ao público em geral. As imagens selecionadas e premiadas compõem um catálogo virtual, fazendo parte do banco de imagens institucionais, sendo passíveis de uso para campanhas, ações, eventos ou sites da UCB.
Resultado geral do concurso
Categoria Pedale com Orgulho
Não houve inscrições nesta categoria
Categoria Cicloviagem
1º lugar – Fernanda Figueiredo Alves
Demais selecionades:
Frederico Souza
Frederico Augusto de Castro Furtado
Vera Marques
Menções Honrosas: Cristiano Scarpelli e Gisele Albertini
Categoria Ciclismo Urbano
1º lugar – Uirá Lourenço
Demais selecionades:
Rafael Barbosa dos Santos
Letícia Moreira Muniz
Rodolfo Almeida Barbosa
Samuel Kassapian Júnior
Menções Honrosas: Caroline Queiroz e Rodrigo Macedo
Categoria Ciclismo Esportivo
1º lugar – Myrian Thereza Fernandes de Lima
Demais selecionades:
Uirá Lourenço
Menção Honrosa: Rodrigo Riqueto Zandominegue
Categoria Paisagem em Duas Rodas
1º lugar – Thaís Lacerda
Demais selecionades:
Robson José Lemos França
Lucas Vinícius Lopez Araújo
Michel Ribeiro de Melo e Silva
Vivian Garelli e Lorena Zschaber
Categoria Mulheres no Pedal
1º lugar: Leilane Antunes Maia
Vera Marques
Raquel Marins do Nascimento
Rosilene Xavier da Silva Lopes
André Vaz
Menção Honrosa: Silvia Ballan
Categoria Cicloativismo
1º lugar – Myrian Thereza Fernandes de Lima
Demais selecionades:
Rafael Barbosa dos Santos
Michel Ribeiro de Melo e Silva
Dado Galvão
Jordeano Araújo Sousa
Categoria Identidades
1º lugar – Uirá Lourenço
Demais selecionado:
Frederico Souza