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30 de junho de 2013

55 – responsabilidade civil. presença de detritos na via pública. queda de bicicleta. responsabilidade da construtora. dano moral

70052610367
Comarca de Porto Alegre
25-04-2013
Marcelo Cezar Muller

PODER JUDICIÁRIO

———- RS ———-

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MCM

Nº 70052610367

2012/Cível

responsabilidade civil. presença de detritos na via pública. queda de bicicleta. responsabilidade da construtora. dano moral.

O construtor é responsável pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes do mau armazenamento de material utilizado na obra, porquanto é seu dever dar a adequada destinação aos detritos produzidos na obra e a manter a limpeza do local e imediações.

Ausente prova dos alegados danos materiais, os quais devem comprovados para a procedência do pedido.

O dano moral deve ser estabelecido com razoabilidade, de modo a servir de lenitivo ao sofrimento da vítima.

Os juros de mora são contados do evento danoso.

Apelação parcialmente provida.

Apelação Cível Décima Câmara Cível
Nº  70052610367 Comarca de Porto Alegre
BRUNO ANDRE NOGUEIRA ARGENTI APELANTE
FBF ENGENHARIA LTDA APELADO

ACÓRDÃO

 

           Vistos, relatados e discutidos os autos.

           Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento à apelação.

           Custas na forma da lei.

           Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana (Presidente e Revisor) e Des. Paulo Roberto Lessa Franz.

           Porto Alegre, 25 de abril de 2013.

DES. MARCELO CEZAR MÜLLER,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Marcelo Cezar Müller (RELATOR)

           BRUNO ANDRÉ NOGUEIRA ARGENTI, menor representado por seu pai, Otávio Argenti, apela da sentença das fls. 150/153 que, em ação de reparação de danos morais e materiais que move contra FBF ENGENHARIA LTDA., julgou improcedente o pedido e condenou o autor nas penas da sucumbência.

           Este o teor do relatório da sentença:

    Narrou, em síntese, que o autor-menor de 9 anos à época, passeava de bicicleta na via pública, quando derrapou, sofrendo um corte em sua perna direita, necessitando de pontos e curativos realizados por cerca de 30 dias, impossibilitando o mesmo de frequentar as aulas e brincar com seus amigos. Relatou que a queda se deu por causa de resíduos de materiais de construção espalhados no leito da rua, deixados por empregados da empresa ré. Disse, ainda, que a empresa já havia sido notificada quanto ao dejetos deixados na calçadas. Alegou ter o fato causado grande abalo emocional, depressão e desgaste psicológico, devendo o réu indenizar o dano sofrido, além dos danos materiais, pois houve gastos com transporte, medicamentos e materiais para curativos, no valor de R$ 600,00. Discorreu sobre o dever de zelo com a obra, bem como da responsabilidade pela guarda de coisa. Postulou pela procedência da ação, para reconhecer a responsabilidade objetiva da ré, devendo indenizar o autor pelos danos morais, no valor de R$ 600,00 e materiais, no valor de R$ 15.000,00. Pediu AJG. Juntou documentos.

    Foi dado vista ao MP (fl. 40), restando deferida a AJG à fl. 41.

    Citada, a ré contestou às fls. 54/70. Sustentou, preliminarmente, inépcia da inicial quanto aos danos materiais, uma vez que o autor não traz nenhum comprovante de gastos realizados em face do acidente, bem como cerceamento de defesa , pois não foi demonstrado onde exatamente ocorreu a queda. Impugnou os documentos juntados com a inicial. Alegou ilegitimidade passiva, uma vez que quem é responsável pela via pública é ente Público Municipal. No mérito, aduziu a inexistência de nexo causal entre o fato e o dano alegado, bem como ser responsabilidade do genitor da criança zelar pelo seu bem. Relatou, ainda, a inocorrência de dano moral. Postulou pela improcedência da demanda. Juntou documentos.

    Houve réplica às fls. 77/83.

    Durante a instrução foram inquiridas as testemunhas arroladas pelas partes, sendo indeferido o pedido de depoimento pessoal do autor, contra qual foi apresentado agravo retido, sendo mantida a decisão recorrida.

    Encerrada a instrução, o debate oral foi substituído por memoriais apresentados pelo autor e pelo réu às fls. 131/133 e 134/144, respectivamente.

    Em parecer final, representante do MP opinou pela parcial procedência da demanda.

    Vieram os autos conclusos para sentença.

           Em suas razões, alega o apelante que o acidente que o vitimou ocorreu em decorrência da presença de resíduos de material de construção deixados pela ré na calçada em frente à obra e que, pela ação do tempo, se espalharam pelo leito da rua, provocando a derrapagem da bicicleta que conduzia e sua queda, com ferimento grave na coxa da perna direita, além do sofrimento físico e psicológico. Afirma encontrar-se provado o nexo causal entre os danos sofridos e o mau armazenamento do material de construção empregado pela ré na obra que ali havia. Pede a reforma da sentença, com o reconhecimento dos danos materiais e morais em seu favor.

           O recurso foi contrarrazoado.

           Opina o Ministério Público pelo conhecimento e parcial provimento da apelação.

           É o relatório.

VOTOS

Des. Marcelo Cezar Müller (RELATOR)

           Versam os autos sobre demanda indenizatória por danos morais e materiais sofridos pelo apelante em decorrência de uma queda com suabicicleta, na via pública, defronte a um prédio que estava sendo construído pela demandada ao lado de sua residência.

           Ao se acidentar, em razão da presença de resíduos de materiais de construção deixados no meio da rua pelos empregados da construtora ré, o apelante sofreu um corte em sua perna direita, necessitando pontos e curativos, além de ter ficado com restrições nas suas atividades habituais por cerca de um mês.

           Defende o dever de indenizar da apelada, pois era de sua responsabilidade manter adequadamente armazenados os materiais de construção utilizados na obra. Lembra que o acidente ocorreu em 13 de março de 2012, sendo a construtora notificada pelo Município em 16 de março de 2012, enquanto que a situação somente foi regularizada em 18 do mesmo mês.

           A matéria posta em exame foi bem analisada pela ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Maria de Fátima Dias Ávila, no parecer constante nas fls. 176/178. Assim, peço vênia para transcrever os fundamentos por ela utilizados, adotando-os como razões de decidir, verbis:

    O autor ajuizou ação ordinária postulando indenização por danos materiais e morais em decorrência de acidente sofrido quando trafegava pela via pública com sua bicicleta, o qual teria sido ocasionado pela presença de detritos decorrentes de uma obra realizada pela apelada.

    De acordo com a petição inicial, o demandante trafegava com sua bicicleta, oportunidade em que veio a derrapar nos restolhos de brita e de areia localizados no paralelepípedo da rua, que não haviam sido recolhidos pela ré após a realização das obras.

    O art. 12, do CDC, prevê a regra da responsabilidade objetiva do construtor em relação aos danos provenientes de defeitos de construção: 

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

    Por defeito de construção deve se entender não somente as questões atinentes à realização da construção em si ou do projeto, mas também todos os aspectos que lhe são corolários, como, por exemplo, a correta armazenagem do material utilizados na obra, bem como a destinação adequada dos detritos e a limpeza do local e imediações afetados pela sua consecução.

    Por outro lado, o autor, na condição de vítima potencial, ainda que não tenha sido parte na contratação da empreitada, ajusta-se ao conceito de consumidor por equiparação previsto no art. 17, do Diploma Protetivo:

Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.

    No caso, não se pode olvidar da responsabilidade da empresa demandada na reparação dos danos morais sofridos pelo autor, uma vez que a prova oral carreada aos autos foi enfática ao mencionar que o menino derrapou com sua bicicleta nos dejetos deixados pela empreiteira na via pública.

    Com efeito, a testemunha Roberto Serigatto afirmou que o menor caiu quase em frente a obra e que havia material de construção na rua (fls. 120 e verso). Essa afirmação corrobora como depoimento prestado por Carlos Eduardo Da Silveira (fl. 122, verso), salientando que o autor efetivamente escorreu nesse material.

    Dessa forma, não se pode olvidar que a queda do autor decorreu da circunstância de a apelada não ter providenciado a remoção dos detritos provenientes da execução da obra no local, revelando-se, portanto, essa omissão como causa adequada à produção do evento lesivo.

    Por outro lado, cumpre mencionar que de acordo com o Código Brasileiro de Trânsito traz a rua como local apropriado para o tráfego de bicicletas, sendo a calçada destinada aos pedestres.

    O dano moral, por sua vez, revela-se in re ipsa, porquanto decorrente da própria dimensão das lesões sofridas, uma vez que, conforme prova testemunhal e fotografias de fls. 23 e ss., o ferimento suportado pelo menor necessitou receber suturação e demandou sua permanência no hospital por alguns dias.

    Assim, presentes os pressupostos da responsabilidade civil, tem-se configurado o dever de indenizar os danos morais sofridos pela parte requerente, sugerindo o Ministério Público que a verba indenizatória seja arbitrada no valor de R$ 4.000,00.

    No que diz respeito aos danos materiais, não há  qualquer elemento de prova que corrobore as alegações contidas na petição inicial, razão pela qual o pleito improcede quanto ao tópico.

           Com relação ao pedido de indenização por danos materiais não trouxe o autor nenhuma comprovação de gastos que tenha efetuado. Assim, não procede o pedido, no ponto.

           O Egrégio Superior Tribunal de Justiça, à vista da conhecida ausência de critério legal orientador para a fixação do quantum indenizatório, assentou a necessidade de observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (REsp 521.434/TO, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04.04.2006, DJ 08.06.2006 p. 120).

           Conforme conhecida lição de Caio Mário da Silva Pereira:

A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo mais valioso do que os integrantes de seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva” (Responsabilidade Civil, nº 49, pág. 60, 4ª edição, 1993).

           Com efeito, à falta de fórmula expressa, o valor da indenização deve-se mostrar adequado a atender aos objetivos da compensação do dano e o caráter pedagógico, levando-se em conta, ainda, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

           A indenização por dano moral deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido e de infligir ao causador sanção e alerta para que não volte a repetir o ato. A eficácia da contrapartida pecuniária, por sua vez, está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado.

           A jurisprudência recomenda ainda a análise da condição econômica das partes, a repercussão do fato e a conduta do agente para a justa dosimetria do valor indenizatório.

           Considerando as circunstâncias da causa, impõe-se fixação do montante indenizatório em R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigidos monetariamente pelo IGP-M, a partir desta data até o efetivo pagamento, e acrescidos de juros de mora de 12% ao ano, a contar da data do evento danoso, conforme entendimento da Súmula 54 do STJ.

           Havendo sucumbência recíproca, condeno a ré  ao pagamento de 50% das custas processuais e de honorários advocatícios ao procurador da parte autora, os quais arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 20, § 3º, do CPC. Fica o autor responsável pelos restantes 50% das custas do processo e pelos honorários do procurador da ré, os quais, com fulcro no artigo 20, § 4º, do CPC, fixo em R$ 400,00, respeitada a gratuidade da justiça.

           Ante o exposto, dou parcial provimento à  apelação.

Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana (PRESIDENTE E REVISOR) – De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Paulo Roberto Lessa Franz – De acordo com o(a) Relator(a).

DES. JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA – Presidente – Apelação Cível nº 70052610367, Comarca de Porto Alegre: “DERAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME.”

Julgador(a) de 1º  Grau: PAULO CESAR FILIPPON