53 – CONDENAÇÃO DIRETA DA SEGURADORA. DANO EMERGENTE. LUCRO CESSANTE. Colisão da Bicicleta por trás.
Comarca de Porto Alegre
15-05-2013
Bayard Ney de Freitas Barcellos
PODER JUDICIÁRIO
———- RS ———-
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
BNFB
Nº 70052214939
2012/Cível
RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. culpa concorrente. SUCUMBÊNCIA. COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS. MÁ-FÉ PROCESSUAL. PREQUESTIONAMENTO. SEGURO OBRIGATÓRIO. CONDENAÇÃO DIRETA DA SEGURADORA. DANO EMERGENTE. LUCRO CESSANTE.
Caracterizada a culpa concorrente de ambos os motoristas pelo evento narrado nos autos. Sucumbência recíproca. Compensação da verba honorária.
Sentença de natureza condenatória. Honorários devidos ao demandante fixados conforme o art. 20, §3º, do Código de Processo Civil.
A condenação direta da seguradora é possível e sua responsabilidade está embasada no contrato de seguro que celebra com a parte denunciante, sendo possível sua condenação até o limite da apólice de seguro. Tendo havido pretensão resistida por parte da Seguradora, deve ser condenada nas custas do incidente e honorários profissionais do patrono do denunciante.
Os danos pessoais ou danos corporais englobam o dano moral e o dano estético. Quantum mantido.
O dano patrimonial/material, abrange os danos emergentes e os lucros cessantes, bem como as despesas médicas e conserto da bicicleta.
Má-fé. Desacolhimento do pedido.
Dano emergente e lucro cessante. Desacolhimento do pedido.
O valor do seguro obrigatório pode ser descontado do montante da indenização, contudo desde que comprovadamente pago.
Danos materiais deferidos de acordo com a prova dos autos.
Indenização por danos morais: correção monetária desde o arbitramento e juros de mora do evento danoso. Indenização por danos materiais: correção monetária de cada desembolso e juros do sinistro.
Do prequestionamento. O julgamento, em sede de recurso, desde que fundamentado, não precisa se reportar especificamente aos artigos indicados pela parte.
PRIMEIRA APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
SEGUNDA APELAÇÃO IMPROVIDA.
RECURSO ADESIVO IMPROVIDO.
Apelação Cível | Décima Primeira Câmara Cível |
Nº 70052214939 | Comarca de Porto Alegre |
TRANS NILTON TRANSPORTES LTDA | APELANTE/RECORRIDO ADESIVO; |
BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS | APELANTE/RECORRIDO ADESIVO; |
RAFAELLE POSSENTI | RECORRENTE ADESIVo/APELADo. |
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento à primeira apelação e negar provimento à segunda e ao recurso adesivo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Luiz Roberto Imperatore de Assis Brasil e Des.ª Katia Elenise Oliveira da Silva.
Porto Alegre, 15 de maio de 2013.
DES. BAYARD NEY DE FREITAS BARCELLOS,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Bayard Ney de Freitas Barcellos (RELATOR)
Parto do relatório da sentença:
RAFAELLI POSSENTI ajuizou ação indenizatória em desfavor de TRANS NILTON TRANSPORTES LTDA., partes devidamente qualificadas.
Narra que no dia 08.09.2004, por volta das 15h30min, o autor encontrava-se na Avenida Sertório, conduzindo sua bicicleta no sentido centro-bairro, no cruzamento com a Avenida Assis Chatobrian, com o sinal fechado para o fluxo de veículos da Avenida Sertório, o que autorizava ao autor e sua bicicleta a efetuar a travessia na Avenida Chatobrian utilizando a Avenida Sertório. Diz que quando efetuava a travessia foi colhido por trás pelo veículo caminhão Ford Cargo 1415, cor branca, placas IDB 8296, de propriedade da requerida, e na ocasião conduzido por Paulo Ricardo Benfica Selistre Júnior. Menciona que o caminhão transitava pela Avenida Sertório na mesma direção do autor, quando ultrapassou o cruzamento com o sinal vermelho, vindo a ocorrer a colisão. Refere que em razão da colisão, caiu e o caminhão passou por cima de seu corpo, causando inúmeras lesões. Refere que o condutor do caminhão não prestou socorro ao autor. Sustenta que o caminhão avançou o sinal vermelho. Aduz que, no processo crime, o condutor do veículo aceitou a transação penal. Relata que à época do sinistro, era piloto comercial de avião, e que não possui mais condições de desempenhar suas atividades profissionais. Requer danos materiais no montante de R$ 21.844,33, decorrentes dos tratamentos médicos realizados. Também menciona os lucros cessantes e danos emergentes. Postula uma pensão vitalícia na razão de R$ 7.408,83, danos morais equivalentes a 200 salários mínimos, além de danos estéticos também na razão de 200 salários mínimos. Em tutela antecipada, postulou fosse averbado o registro dos veículos de propriedade da demandada. No mérito, pugna pela procedência da ação. Junta documentos.
Concedida A.J.G.,e indeferida a antecipação de tutela, fl. 128.
Citada (fl. 132), apresenta contestação, fls. 136/153. Em preliminar, postulou a denunciação da lide da seguradora BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS S.A. Discorre sobre os fatos, confirmando a ocorrência do acidente na data mencionada pelo autor. Sustenta que o sinal encontrava-se aberto para o caminhão que transitava na Avenida Sertório. Advoga pela ausência de responsabilidade civil no caso em tela. Insurge-se em relação aos pedidos indenizatórios formulados pelo autor. Impugna os documentos apresentados. Refere que o autor foi demitido muito antes da data do acidente narrado na exordial, e que a ação trabalhista ajuizada tramitou à revelia da reclamada, não sendo possível aferir os reais vencimentos do autor à época. Dessa forma, não prospera o pedido de pensionamento nos termos postulados. Discorre sobre o dano moral e estético mencionado pelo autor, bem como de sua não caracterização no caso em tela, pois não comprovou o autor que os fatos repercutiram negativamente na sua esfera moral. Em caso de condenação em danos extrapatrimoniais, requer sejam estes fixados com moderação. Pugna pela improcedência da ação. Junta documentos.
Sobreveio réplica às fls. 175-179.
Foi deferida a denunciação da lide, fl. 181.
Citada, a denunciada apresentou contestação (fls. 186/206). Em preliminar, aceita a denunciação. Relata os fatos trazidos pelo autor. No mérito, alega que o autor não se desincumbiu do ônus que lhe cabia, de trazer provas dos fatos constitutivos do seu direito. Sustenta não haver conduto ilícita do demandado, segurado. Discorre sobre a responsabilidade civil. Insurge-se em relação ao pedido de indenização. No tocante as danos morais e estéticos, refere não estarem incluído no contrato de seguro. Da mesma forma, pugna pela improcedência dos pedidos de lucros cessantes e pensionamento. Alega, na hipótese de eventual condenação, os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Impugna as notas fiscais apresentadas a título de despesas médicas. Aduz haver parcelas dedutíveis do DPVAT. Em relação à lide secundária, menciona a obrigação de reembolso ao segurado, e as garantias contratadas. Postula a improcedência da ação.
Sobreveio réplica à contestação da seguradora, ocasião em requereu a decretação da revelia desta, por ser a peça apresentada intempestiva (fls. 283/285).
A revelia foi afastada, fl. 288.
A demandada apresentou réplica à contestação apresentada pela Seguradora Bradesco (fls. 294/297).
Realizada perícia médica, fls. 359/362, sobre a qual as partes apresentaram manifestação.
Oficiada a ANAC, esta prestou informações sobre o autor, fl. 381/384.
Postulou a demandada a condenação do autor em litigância de má-fé (fl. 386/388).
Realizada audiência, a tentativa de conciliação restou inexitosa. Colhido o depoimento pessoal do autor e inquiridas duas testemunhas arroladas pela parte autora, e duas arroladas pela parte ré (fls. 434/450).
Declarada encerrada a instrução, as alegações finais foram apresentadas em forma de memoriais às fl. 458/461 e 483/486 pela parte autora, às fls. 487/489 pela Bradesco Seguros, e às fls. 492/499 pela parte demandada Trans Nilton.
O benefício da AJG concedido ao autor foi revogado, nos moldes do incidente processual em apenso, tendo transitado em julgado a decisão (fl. 110 do incidente)
O autor juntou comprovante de sua atual função, fls. 505/508.
Vieram os autos conclusos para sentença.
Da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial da ação e procedente a denunciação da lide, recorrem as partes.
Opostos embargos de declaração pela TRANS NILTON TRANSPORTES LTDA e pela BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS, foram desacolhidos.
TRANS NILTON TRANSPORTES LTDA, primeiro apelante, alega que a prova é conflitante no que diz respeito à culpa, devendo ser julgados improcedentes os pedidos formulados pelo autor, pois foi quem deu causa exclusiva ao acidente. Também alega que os ônus sucumbenciais foram erroneamente distribuídos, tendo em vista o decaimento das partes, devendo também ser afastada a compensação da verba honorária. Não se conforma com a condenação nas custas processuais da denunciação da lide e pede a condenação do autor por litigância de má-fé, além de prequestionar a matéria recursal.
BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS, segundo apelante, alega que o autor não comprovou os fatos constitutivos de seu direito e foi o único responsável pelo acidente, devendo ser julgados improcedentes os pedidos formulados na inicial da ação. Alega que não ficou comprovado que os danos materiais na bicicleta foram decorrentes do sinistro, que o ressarcimento das despesas médicas deve ser abarcado pela importância prevista para o risco dano corporal/pessoal, que deve ser deduzido o valor do seguro obrigatório, que os danos morais e estéticos não foram contratados e, caso mantida a sentença, o valor deverá ser reduzido. Ainda, para o caso de ser mantida a sentença, entende que os juros incidem da citação e a correção monetária do ajuizamento da ação, no que diz respeito às despesas médicas e danos materiais na bicicleta. Quanto aos danos morais e estéticos, os juros incidem de quando arbitrada a indenização. Por fim, sustenta que não pode ser condenada diretamente frente à parte autora e que devem ser respeitados os limites da apólice.
A BRADESCO apresentou contrarrazões, reiterando os argumentos já expendidos.
O autor também apresentou contrarrazões, bem como ingressou com recurso adesivo, sustentando a culpa única e exclusiva do condutor do caminhão pelo acidente narrado nos autos, devendo ser julgados totalmente procedentes os pedidos formulados na inicial da ação, com a condenação solidária das rés na indenização pretendida e na totalidade da verba sucumbencial.
Contrarrazões da ré e da seguradora, reiterando os termos já expendidos.
É o relatório.
VOTOS
Des. Bayard Ney de Freitas Barcellos (RELATOR)
Tratando-se de responsabilidade civil (art. 186 do Código Civil), é necessária a comprovação do dano, do nexo de causalidade e da culpa do agente, para ser reconhecido o dever de indenizar. Tal comprovação incumbe ao demandante, conforme disposto no art. 333, I, do Código de Processo Civil.
A bicicleta é, oficialmente, um veículo de passageiro, conforme previsto no art. 96 do Código de Trânsito, que sujeita seu condutor às leis de trânsito, com direitos e obrigações. Assim, por consequência, tem-se que a bicicleta também deve obedecer aos limites máximos estabelecidos para os outros veículos ou a sinalização constante na via pública.
No caso, o autor alega que o sinal estava fechado para os veículos que trafegavam pela Avenida Sertório, por onde ele e o caminhão vinham, sendo que quando estava efetuando a travessia com a Avenida Chatobrian o caminhão ultrapassou com o sinal fechado e o abalroou por trás. Ele caiu e o caminhão passou por cima do seu corpo. Afirmou que o sinal estava fechado e que se posicionou próximo ao cordão da calçada e observou o trânsito à sua esquerda e prosseguiu para atravessar a Assis Chatobrian, quando foi atingido pelo caminhão cujo motorista ultrapassou o sinal vermelho e fez menção de convergir à direita, obrigando-o a também dobrar à direita, sendo inevitável o acidente.
Em seu depoimento na audiência, assim constou:
… eu vinha de bicicleta e o sinal estava fechado para mim e para os carros que iriam atravessar a Assis Chatobrian …estava muito bem caracterizado o sinal fechado …
Ao ser inquirido se também havia passado o sinal vermelho, assim alegou:
… Mas eu sou ciclista, eu estava na faixa de segurança, eu olhei para a esquerda e não vinha carro, então era para atravessar.
O motorista do caminhão, por sua vez, afirmou que não viu o ciclista e que sinalizou para dobrar à direita; já ao prestar depoimento quando do inquérito policial, declarou que o ciclista trafegava devidamente pela direita da pista, próximo ao cordão da calçada, mas pensou que ele também dobraria à direita, quando bateu no caminhão. Em seu depoimento neste juízo, afirmou que não viu o ciclista e que provavelmente ele estava mais rápido que o caminhão, tanto é que passou por baixo do caminhão.
Já as testemunhas afirmam que não viram o motorista do caminhão sinalizar a conversão à direita e nenhum depoimento foi no sentido de que o ciclista viesse rápido pela via, ao contrário.
A testemunha que estava junto no caminhão afirmou que o acidente ocorreu bem quando o caminhão estava dobrando à esquina.
Diante do exposto, e tal qual constou na sentença, efetivamente se vislumbra que ambos os motoristas deram causa ao acidente ao desrespeitar o semáforo, não havendo como afastar a hipótese de culpa concorrente na proporção fixada na sentença (art. 945 do CCB).
O artigo 29 do Código de Trânsito estabelece que os pedestres têm prioridade sobre os ciclistas e estes sobre outros veículos. O artigo 38 daquele texto legal também diz que antes de entrar à direita ou à esquerda, o condutor do veículo deverá ceder passagem aos pedestres e cilistas, o que leva ao entendimento que não devem “fechar” as bicicletas. Também o artigo 192 do CTB considera infração grave deixar de guardar distância de segurança lateral e frontal entre o veículo e os demais, bem como em relação ao bordo da pista. De qualquer modo, privilegiando a vida, o CTB também estabelece que o veículo deve dar preferência de passagem ao ciclista e guardar a distância lateral de um metro e cinquenta centímetros ao passar ou ultrapassar bicicleta (art. 201).
Por outro lado, atentando para o dever dos ciclistas, também o CTB estabelece que quando os veículos estiverem em movimento, a bicicletadeve aguardar ou seguir atrás deles, como se fosse outro veículo (art. 211). O art. 68, por outro lado, diz que quando o ciclista quiser atravessar com a bicicleta na faixa, deverá fazê-lo desmontado. E, ainda, estabelece no art. 105 os equipamentos obrigatórios a todo o ciclista, que não existiam no caso concreto, a não ser o capacete.
Impõe-se, portanto, reconhecer a culpa de ambos os motoristas para o sinistro e a sucumbência recíproca, consoante previsto no art. 21 do CPC, sendo que a compensação da verba honorária é admitida conforme o art. 21 do CPC e a Súmula 306, do STJ.
Tratando-se de sentença de natureza condenatória, os honorários devidos ao demandante devem ser fixados conforme o art. 20, §3º, do Código de Processo Civil, entre 10% e de 20% do valor da condenação, considerando as alíneas daquele dispositivo legal. Destaco que a verba honorária arbitrada em favor do patrono da autora deve guardar consonância com o trabalho desempenhado pelo profissional, bem assim com a complexidade da causa e o tempo de tramitação do processo, o que foi observado no caso concreto.
A responsabilidade da Seguradora está embasada no contrato de seguro que celebra com a parte denunciante, sendo possível sua condenação até o limite da apólice de seguro. Sua obrigação é contratual e legal de arcar com o valor da apólice; uma vez que assume contratualmente o risco, e sendo o segurado obrigado a indenizar, ela responde nos limites do contrato de seguro.
A condenação direta da seguradora é possível, não havendo necessidade de que o segurado primeiro tenha que desembolsar o valor da condenação para somente após ser ressarcido.
Considerando que o contrato de seguro é uma estipulação em favor de terceiro, pode a autora buscar o cumprimento da sentença diretamente em relação à seguradora.
O dano patrimonial, também chamado dano material, abrange os danos emergentes e os lucros cessantes, sendo que no caso não houve condenação a esse título.
Os danos pessoais ou danos corporais englobam o dano moral e o dano estético e dizem respeito tão somente à lesão exclusivamente física causada ao corpo da pessoa e que implique em perda ou redução de membro ou função.
O dano patrimonial, conforme já dito, diz respeito à lesão concreta que afeta um interesse referente ao patrimônio da vítima, como o próprio nome já diz, e que consistente na perda ou deteriorização, total ou parcial, dos bens materiais que a ela pertencem, suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável. Abrange os danos emergentes, que corresponde ao que o lesado efetivamente perdeu, tal como as despesas médicas, conserto de veículo, despesas de sepultamento etc, e o lucros cessantes, que é o aumento que teria em seu patrimônio, mas que não ocorreu por força do sinistro e que, no caso concreto, não foram demonstrados.
Os danos morais, por sua vez, estão incluídos na rubrica danos pessoais ou danos corporais. Se a apólice prevê cobertura para os danos pessoais, a seguradora deverá ressarcir o denunciante no que for condenado a título de danos morais. Tendo havido pretensão resistida por parte da Seguradora, deve ser condenada nas custas do incidente e honorários profissionais do patrono do denunciante, que fixo em R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais).
Neste sentido:
“APELAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. INVASÃO DA CONTRAMÃO. PERDA DO CONTROLE DE CAMINHÃO. LESÕES. DANOS ESTÉTICOS. DANOS MORAIS. COBERTURA SECURITÁRIA. LITISDENUNCIAÇAO E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
(…) 4.Cobertura securitária dos danos morais. Apontando o caso concreto não haver expressa exclusão ou previsão de danos morais na apólice, a seguradora deve ressarcir o montante arbitrado para o gênero danos pessoais, até o limite contratual. 5.Honorários advocatícios na litisdenunciação. São devidos, porque caracterizada pretensão resistida. Seguradora que sustentou falta de cobertura para danos morais, pleito desacolhido. Apelo da autora provido em parte. Apelo da seguradora litisdenunciada improvido.” (Apelação Cível Nº 70017063470, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Orlando Heemann Júnior, Julgado em 29/03/2007).
A apólice estipula o limite máximo de indenização, sendo que nos danos materiais incluem-se as despesas médico hospitalares, até a indenização por invalidez permanente, total ou parcial e o tratamento médico necessário.
Os danos materiais na bicicleta, conforme consta nos autos, foram em razão do sinistro, basta ver os documentos juntados.
O seguro obrigatório objetiva indenizar as vítimas com danos pessoais em acidentes de trânsito (morte, invalidez permanente e/ou reembolso de despesas médicas), não podendo ser deduzido da indenização por danos morais.
Outrossim, a Câmara já firmou entendimento de que o valor do seguro obrigatório pode ser descontado do montante da indenização, contudo desde que comprovadamente pago. Se não há nos autos comprovação de que os autores tenham recebido o seguro obrigatório, não poderá ser deduzido do montante indenizatório.
Tratando-se de indenização por danos morais, a correção monetária incide desde a data do arbitramento (Súmula 362 do STJ); os juros de mora incidem do evento danoso, conforme a Súmula 54 do STJ.
No que diz respeito aos danos materiais, a correção monetária incide de cada desembolso e os juros do sinistro, conforme a Súmula 54 do STJ.
O dano estético é a ofensa à imagem externa da pessoa, a modificação física permanente do aspecto externo, da aparência, caracterizado pela ofensa direta à integridade física da pessoa.
Em demandas indenizatórias decorrentes de acidente de trânsito, o quantum fixado na condenação a título de ressarcimento por danos morais funciona tanto como pena ao causador do dano, quanto como reparação da lesão causada à vítima ou a seus parentes com vínculos afetivos mais próximos.
Com tal indenização, busca-se a compensação ou a reparação satisfativa àqueles que sofreram o abalo moral, levando-se em conta a dor e o sofrimento psicológico suportados.
Na fixação do quantum, não se pode permitir o enriquecimento indevido, com a fixação de montantes excessivos, assim como não pode haver valor ínfimo que sequer compense o dano experimentado pela vítima, pois o ressarcimento deve servir para evitar a repetição da conduta danosa.
No caso concreto, o autor sofreu lesões consideráveis que incluíram fraturas na face, na bacia e na escápula direita, sendo que necessitou de duas cirurgias e outros tantos procedimentos médicos para se recuperar. Ficou com discreta claudicação com arrasto do pé direito e discreta hipotrofia muscular do ombro direito, porém sem perda de mobilidade, mas perdeu completamente a mobilidade sacroilíaca à direita e ficou com cicatrizes na coxa direita. As disjunções na bacia foram tratadas cirurgicamente com placas e parafusos. Assim, diante desse quadro, não há falar em redução do montante indenizatório que foi fixado na sentença em R$ 1.500,00 para os danos estéticos e R$ 4.000,00 pelos danos morais.
Também não há falar em má-fé do autor, pois não é o fato de não ter comprovado seus efetivos rendimentos à época do acidente, ou por outro lado ter vindo a informação de que ainda exerce sua antiga função o suficiente para tal condenação. As provas e peculiaridades do caso não indicam dolo processual exigível à configuração da lide temerária.
Quanto ao pedido de dano emergente e lucro cessante, importa salientar que o próprio autor relatou na justiça trabalhista que em março de 2004 foi dispensado sem justa causa do cargo de piloto junto à empresa RAZANTE AVIAÇÃO AGRÍCOLA LTDA, sendo que o acidente ocorreu emsetembro de 2004. Em 17.05.2005 ingressou junto à Previdência Social com pedido de auxílio-doença, que foi concedido, sendo que em outubro de 2008 já não estava recebendo o auxílio previdenciário. Por outro lado, a ANAC informou em março de 2009 que o autor é portador de licença de piloto comercial de avião, que foi expedida em maio de 1998, sendo que na data de março de 2009 já estava exercendo a função de co-piloto na empresa GOL Linhas Aéreas. Por outro lado, quando se submeteu à perícia em outubro de 2008, afirmou que ao final da validade do brevê de piloto agrícola decidiu desistir da atividade e passou a trabalhar com a confecção de pranchas de surfe.
Assim, correta a sentença que desacolheu o pedido de lucros cessantes e pensionamento vitalício, diante do desencontro e inconsistência das informações prestadas nos autos.
Acrescento ao exposto o que constou na sentença à respeito:
No que diz respeito aos lucros cessantes requeridos na inicial, não logrou êxito a parte requerente demonstrar seus rendimentos à época do acidente, razão pela qual, deixo de condenar a demandada ao pagamento de lucros cessantes. Saliento que os documentos de fls. 74/82 demonstram que o autor laborou no período de 04.12.2003 a 20.03.2004, exercendo a atividade de piloto agrícola, sendo que o sinistro ocorreu em 08/09/2004, quando o demandante já não mais laborava no local indicado.
Aqui, por oportuno, também afasto o pedido de pensão vitalícia, pois demonstrado estar o autor, atualmente, exercendo a atividade de piloto (fls. 507/508), demonstrando que não houve redução na sua capacidade laborativa.
Quanto aos danos materiais, foram minuciosamente examinados pela Magistrada a quo os documentos juntados, sendo que transcrevo a parte da fundamentação sentencial nesse sentido, agregando-a às razões de decidir:
No tocante aos danos materiais, comprovados pelo requerente no montante total de R$ 19.086,62, conforme documentos acostados ao feito (fl. 85 – R$ 28,73, fl. 86 – R$ 53,29, fl. 87 – 34,55, fl. 88 – R$ 21,17, fl. 89 – R$ 20,79, fl. 90 – R$ 15,21, fl. 92 – R$ 27,33, fl. 95 – R$ 7,55, fl. 97 – R$ 38,00, fl. 99 – R$ 10,50, fl. 101 – R$ 40,00, fl. 102 – R$ 40,00, fl. 103 – R$ 40,00, fl. 104 – R$ 60,00, fl. 105 – R$ 55,00, fl. 106 – R$ 80,00, fl. 107 – R$ 15,00, fl. 108 – R$ 11.830,00, fl. 109 – 840,00, fl. 110 – R$ 550,00, fl. 111 – R$ 150,00, fl. 112 – R$ 450,00, fl. 113 – R$ 4.000,00, fl. 114 – R$ 300,00, fl. 115 – R$ 200,00, fl. 116 – R$ 130,00, e fl. 117 – R$ 49,50). Mencionados gastos, ressalto, estão vinculados ao evento danoso, devendo a parte requerida, em decorrência da culpa concorrente, arcar com 50% dos custos havidos em virtude do acidente.
Os demais comprovantes, ou estão em nome de pessoa diversa, ou em data anterior ao sinistro, não sendo, portanto, devidos os gastos ali descritos.
Quanto ao prequestionamento, é necessário esclarecer que o julgamento em sede de recurso, desde que fundamentado, não precisa se reportar especificamente aos artigos indicados pela parte. Basta que se indiquem, no julgado, os motivos que formaram o convencimento (art. 131 do CPC).
Por todo o exposto, dou parcial provimento à primeira apelação (da ré), para condenar a seguradora nas custas do incidente e honorários profissionais do patrono do denunciante, que fixo em R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais); nego provimento à segunda apelação (da seguradora) e ao recurso adesivo interposto pelo autor.
Des. Luiz Roberto Imperatore de Assis Brasil (REVISOR) – De acordo com o Relator.
Des.ª Katia Elenise Oliveira da Silva – De acordo com o Relator.
DES. BAYARD NEY DE FREITAS BARCELLOS – Presidente – Apelação Cível nº 70052214939, Comarca de Porto Alegre: “DERAM PARCIAL PROVIMENTO À PRIMEIRA APELAÇÃO E NEGARAM PROVIMENTO À SEGUNDA E AO RECURSO ADESIVO. UNÂNIME.”
Julgador(a) de 1º Grau: PATRICIA HOCHHEIM THOME