Mulheres merecem caminhar sem interrupções, violências ou abandonos
Por Luise Reis
[Coordenadora do GT Jurídico da UCB, Advogada e pesquisadora, bacharela em Direito pela Universidade Católica de Salvador, bacharela em Letras pela UFBA, Mestre em Linguística Aplicada (UFBA /Universidad de Deusto – Bilbao)].
Todos os meus textos nascem tipo uma alien que está dentro de mim serpenteando dos pés até a cabeça.
Por vezes, os textos têm uma fome voraz de caderno e caneta. Em outras, estão no post-it digital e colorido. Uma cor pra cada sentimento até para aqueles que sinto, mas não sei dar nome. E olha que amo dar nomes a coisas e personagens.
O texto de hoje é sobre Juliana¹ e Julieta². Para além do axioma dos nomes, porque mulheres livres, corajosas e sonhadoras são a todo tempo admoestadas e contidas?
É hospício, é prisão, é violência doméstica, psicológica, patrimonial e emocional. É tanta merda, que é preciso coragem, mas muita certeza de si pra mandar o patriarcado, a heteronormatividade, as simbioses e modelo obsoletos pelos ares e queimar tudo que ousa aprisionar almas brincantes.
Fiz algo muito certo porque Debora³ (minha companheira in memorian) nem nos piores cenários era o tipo sapatão machista. Pelo contrário, nosso melhor jogo era responder gente nas baladas: não veio, mas tá tudo bem! Depois evoluímos para: não soube, não? É uma saída dramática. Ela me paga um dia por ter usado a saída dramática e silenciosa contra mim.
Queimamos nas fogueiras da Santa Igreja e ainda hoje: morrer na trilha de um vulcão, mergulhando com tubarões ou abraçada com minhas pessoas favoritas num balão é o tipo de morte que me será bem cabível.
Ou vou morrer embolorada em alguma floresta fazendo veneno e enterrando gente escrota, sob flores raras e banalíssimas. As minhas companheiras não deixo pra traz, mas peço que também não me atrasem.
Vamos criar Egrégoras⁴ Pós-Modernas. Chequem suas amigas, usem aplicativos e funções de segurança, tenham seu próprio Conclave. Tempos difíceis para as sonhadoras, mas juntas podemos destruir essa horda.
“Há épocas em que só o amor é remédio.
Não o amor febril dos romances apressados,
mas aquele que reumaniza o olhar,
que devolve à alma a paciência dos sábios,
a esperança dos poetas e o perdão dos que compreendem.
Drummond escreveu como quem anteviu nossas dores.
E deixou, em palavras suaves, a receita:
amor que nos corrija, que nos abrigue,
que nos salve — ainda que em silêncio.”
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¹ Juliana Marins – brasileira, publicitária vítima fatal do descaso e abandono ao fazer turismo na Indonésia.
² Julieta Hernández – venezuelana, artista e cicloviajante, vítima de feminicídio ao retornar para seu país de origem, o triste fato ocorreu no Brasil.
³ Debora Freitas Mendes Pereira – brasileira, delegada da polícia civil baiana e advogada criminalista, falecida em 2021 acometida por uma neoplasia;
⁴Egrégoras – uma entidade não física que surge da energia coletiva de um grupo de pessoas, resultante de seus pensamentos, sentimentos e ações.